Desde a campanha em 2012 com a formação da “Onda Azul” o processo eleitoral ganhou contornos diferentes, se antes o debate se assemelhava ao de um clube qualquer falando de obras na sede com mescla de momentos surtados onde se prometiam grandes jogadores, com a campanha acontecendo entre os muros da Gávea, a partir daquele ano o debate ganhou o Brasil através do uso maciço das redes sociais e a movimento de mudança veio de fora para dentro. Hoje o debate se dá em um patamar de exigência que tem como centro de discussão finanças e responsabilidade fiscal, se fala em governança e projetos.
As mudanças são um reflexo do principal compromisso da chapa vencedora em 2012: Recuperar a imagem do Flamengo enquanto instituição e tornar o clube um dos protagonistas do futebol brasileiro. Hoje o Flamengo não só ganha prêmios de administração como é bem visto no mercado, grandes empresas querem associar sua marca ao clube e, além disto, o clube foi protagonista da semente de uma revolução ao lutar e liderar o movimento pela Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte, que ficou conhecida por ProFut.
E, apesar do futebol ter deixado a desejar, a administração marcou vários golaços em outros departamentos, dentre os quais os mais celebrados pela torcida pelas conquistas de peso obtidas foram o Departamento Financeiro e o Departamento de Marketing, cujo desempenho “criou” os torcedores de CND e borderô tão “aclamados” nas redes sociais pela oposição.
Os dois responsáveis diretos por esses departamentos, seja na reestruturação ou na condução de decisões importantes, foram Tostes e Bap durante os primeiros dois anos e parte deste ano. Ambos deram entrevistas essa semana em campanha pela Chapa Verde, Tostes para o Periscope da @vivi_mariano e Bap para o Túlio do Blog Ser Flamengo, as quais comentarei a seguir.
Entrevista do Tostes
Imagem de divulgação do Periscope da Vivi com TostesSendo o Mago das finanças, Tostes foi questionado pelo trabalho feito na atual gestão e suas expectativas para o próximo triênio, assim como sobre propostas da Chapa Verde, a qual disputa como oposição (estranho isso, não?) à chapa do atual presidente, Eduardo Bandeira de Mello.
De cara Tostes nos dá um banho gelado sobre suas expectativas para o próximo ano, já que ao contrário do Flamengo o país não fez sua lição de casa, o que deixou o Brasil mergulhado em uma crise que está longe de alcançar seu pior momento.
A crise econômica está impactando as empresas que estão passando por uma série de reformulações na estratégia do negócio, repensando suas atuações no Brasil e até demitindo em massa para equilibrar as contas. Nesse cenário, o natural segundo Tostes é que haja um corte no orçamento de marketing das empresas, exemplo que este ano vimos com a Caixa saindo de vários clubes e dando indicações de saída do futebol no ano que vem.
Com todos os contratos de patrocínio da camisa, a exceção do contrato da adidas, terminando em dezembro, o natural é esperar problemas em renovações e na busca por novos patrocinadores. A Viton que estampa as costas e as mangas já vem atrasando o pagamento das parcelas ao Flamengo e não deve renovar, a Caixa também segue em crise e pode não renovar.
Segundo Tostes, que até muito pouco tempo estava na administração do clube, não há empresas batendo na porta para patrocinar o Flamengo, ponto onde torna-se essencial ter uma rede de contatos que facilite a aproximação com grandes empresas, que possam associar sua marca ao clube.
Esses problemas associados a outros impactos diretos e indiretos da crise brasileira no clube tendem a impactar negativamente na geração de receitas, entretanto as necessidades de investimento são grandes, o que não permitirá sobra de caixa no Flamengo. Assim, entre investimentos de peso em infraestrutura ou no futebol, a opção é pelo término do Centro de Treinamento que fará o futebol do Flamengo mudar de patamar no médio e longo prazo.
Outro ponto importantíssimo da entrevista foi a discussão sobre a “troca de dívida pública por privada” feita nesse triênio e que é uma das principais acusações que a Chapa Branca faz as chapas concorrentes. A resposta começou com a explicação de que o Flamengo não tinha dívida pública e sim dívida com o fisco, assim não havia opção de não negociar a dívida e pagar, portanto, os empréstimos foram necessários para regularizar a situação do clube.
Lembremos ainda que é graças a obtenção das CNDs que o clube pode ter programas de incentivo que financiam os esportes olímpicos, os quais antes eram financiados pelo futebol, e também é o que permite ao clube ter o patrocínio da Caixa, que é uma empresa pública.
Entretanto a tomada de empréstimos não é a única forma do clube arrecadar e Tostes critica duramente atitudes recentes da administração. Segundo ele, houve por parte dele a cobrança de que a compra do Ederson estivesse vinculada a venda de um jogador, porém isto foi descumprido pela atual gestão. A venda de um atleta poderia ter evitado a necessidade do recente empréstimo de 10 milhões para pagar os salários dos jogadores.
E, justamente a submissão do pedido de empréstimo ao Conselho Deliberativo feito com um prazo de 48 horas para que os salários atrasassem, foi alvo de dura crítica de Tostes que apontou isso como um grave problema de governança. Afinal, se havia o atraso no pagamento do patrocinador e o caixa não permitiria o pagamento da folha do futebol, porque demoraram tanto a propor o empréstimo? Segundo ele, deveria haver consequências graves para o responsável.
Olhando para o futuro, Tostes diz que se antes a preocupação era o resgate da imagem institucional do Flamengo, agora a prioridade é o futebol. Porém, isto não significa inchar o elenco e sim priorizar o término do CT. Para reforçar o time o orçamento não pode ser aberto, tem que se traçar o perfil desejado para os jogadores, mapear as posições carentes e direcionar fatias do orçamento para supri-las.
A polêmica, entretanto, não teve relação com o futebol e sim com a discussão sobre as arenas. Se por um lado ele reforça que a chapa deseja assumir o Maracanã diante das repetidas declarações do Consórcio de devolver o estádio, por outro sinaliza que administrar sozinho é inviável pelos custos e por isso a chapa já conversa com três investidores que têm expertise nesse tipo de administração. Já a Arena que seria construída pelo McDonald’s está ameaçada de não sair do papel, por motivos que Bap explica melhor, e apresenta como opção administrar uma das arenas que serão usadas na Olimpíada em 2016 e que recentemente o poder público decidiu que não desmontará.
Entrevista do Bap
Imagem de divulgação da Chapa VerdeSendo o Mago do Marketing, Bap foi questionado pelo trabalho feito na atual gestão e suas expectativas para o próximo triênio, assim como sobre propostas da Chapa Verde. Como aqui o foco é o Marketing, deixarei de fora os comentários sobre a disputa política que acabaram tomando um tempo razoável da discussão.
Após as apresentações e declarações políticas de praxe, a pergunta que inicia o debate do Marketing é um pedido de avaliação dos dois anos como vice-presidente do departamento e a declaração do que não houve tempo para fazer e onde o clube precisa avançar no próximo triênio nesta pasta.
A resposta passa pelo relato do estado deplorável que a atual administração encontrou ao assumir o clube em 2013 e que obrigou o departamento de marketing a ter que elevar o mais rapidamente possível a arrecadação com o mínimo de investimento. E Bap cita inclusive números ao dizer que sob sua gestão o clube passou a arrecadar 150 milhões por ano tendo uma despesa que variava entre 3 e 4 milhões por ano. Esta arrecadação tem como pilares os patrocínios (negociados pessoalmente por ele), o sócio-torcedor e a bilheteria dos jogos.
O programa de sócio-torcedor elaborado pelo Bap e implementado no primeiro ano da atual gestão é um caso de sucesso sendo um dos que possui maior número de associados adimplentes e o que mais arrecada entre os clubes do Brasil. Como já antecipado no #DesafioDasChapas, a meta da chapa verde seria a de expandir o número de sócios-torcedores para 150 mil que é um pouco mais que o dobro do atual número.
Ao ser questionado sobre melhorias no programa, Bap foi sincero e manteve os compromissos já citados no Mundo Rubro Negro condicionando menores valores de plano ou diminuição no preço do ingresso a diminuição de custo operacional e aumento da arrecadação.
Passando pelos itens que envolvem o número de associados, a discussão começou pelos benefícios e Bap apontou como necessidade aumentar o número de parceiros que proveem descontos. Segundo ele o lastro no programa futebol melhor é insuficiente no apelo popular por não incidir em itens essenciais ao consumidor e que trabalharia para conseguir descontos em itens básicos como na conta de luz e em combustíveis.
Contudo, para a chapa o que mais impacta o crescimento dos associados é um tripé já conhecido e bastante debatido pela torcida: ídolo, time vencedor e estádio próprio. E, segundo ele, faz parte dos planos da chapa trazer mais 2 ou 3 ídolos para se juntarem ao Guerrero e assim também melhorarem o nível técnico do time, que por consequência obteria mais vitórias e melhores resultados esportivos.
Os planos para o estádio citados novamente incluem o Maracanã, mas até pelo formato da entrevista não foram muito trabalhados e aconselho a quem quiser saber melhor sobre isso a ler o que não só a chapa verde, mas a branca e a azul disseram no #DesafioDasChapas.
Algumas críticas que apoiadores de outras chapas têm feito foram colocadas para serem esclarecidas pelo Bap e as principais são: uma possível incoerência sobre o posicionamento do clube diante da FERJ; o que de fato ter um grupo de empresários apoiando a administração representa para o clube; posição de ressalvas a Primeira Liga (antes conhecida como Liga Sul-Minas-Rio).
Sobre o primeiro ponto Bap esclarece que para a Chapa Verde o Flamengo tem que brigar com a FERJ pelo que é melhor para o clube e para o futebol enquanto negócio, mas não pode fazer isso se omitindo das negociações, reuniões e simplesmente cortando o diálogo. Contudo, no evento que culminou no desgaste definitivo dele com o presidente Bandeira e o fez deixar a administração do clube, o que houve foi a decisão do colegiado por não enviar nenhum representante do Flamengo a reunião que trataria do programa de sócio-torcedor da FERJ e de um acordo pelo preço dos ingressos, pois tais medidas eram completamente lesivas ao clube e já estavam sendo questionadas pelo Ministério Público, portanto não haveria o porquê de dar quórum para a reunião.
Resumindo, a gota d’água para Bap deixar a gestão não foi romper ou não com a FERJ, mas o fato do presidente Bandeira ter ido contra a decisão do conselho diretor por não enviar um representante do clube àquela reunião e por não fazer qualquer acordo por preços de ingresso.
Sobre a Primeira Liga ainda não conseguimos saber muito a respeito, saem coisas picadas na imprensa. Não há um contrato com a TV firmado, mas negociações sobre e diz-se que as cotas serão dívidas de um modo que aquele que ganhe menos, tenha apenas uma diferença pequena para o que mais vai ganhar. Algumas notícias dão conta de que 50% será distribuído igualmente e o restante de acordo com a exposição na TV.
O que Bap contesta na entrevista é basicamente a participação do Flamengo em uma Liga presidida pelo Kalil, dirigente adepto das antigas práticas, que há pouco tempo disparava contra a “espanholização” do Campeonato Brasileiro pela divisão desigual de cotas que privilegia Corinthians e Flamengo. Questionando se de fato Kalil poderia lutar por interesses do Flamengo ou estaria utilizando o Flamengo para alcançar seus próprios interesses.
E, dentro dessa discussão, pergunta por que o Flamengo não discute e toma a frente de um movimento para melhorar o futebol como negócio. Apontando o clube, por suas dimensões, como aquele que pode bater de frente com as Federações e a CBF para melhorar inclusive as receitas do futebol. E, desse modo, ao invés de se preocupar com outros clubes e federações querendo tomar parte de sua fatia, propor que todos ganhem mais com o aumento das fatias. Inclusive cita que poderiam subir o valor de 4 bilhões para 8 bilhões se repensassem o modelo de futebol no Brasil.
Por fim, questionado sobre o que realmente representaria para o clube ter na administração um grupo apoiado por grandes empresários, Bap cita um caso recente: O presidente Bandeira teria tentando entrar em contato com a presidente da Caixa e não teria conseguido, entretanto, após Ruben Osta –empresário de seu grupo de apoiadores – ligar para a presidente da Caixa, conseguiu que Bandeira fosse recebido por ela.
Ou seja, o objetivo de ter um grupo forte de empresários apoiando a chapa é construir uma rede de contatos formada por nomes de peso no mercado que possam influenciar na divulgação da boa imagem do clube no meio empresarial e servir de ponte para o estabelecimento de contatos entre o clube e empresas de interesse ou favorecer o Flamengo em algumas disputas ou negociações complicadas com federações ou outras entidades.
A entrevista também tentou esclarecer a polêmica levantada na noite anterior pelo Tostes sobre a Arena McDonald’s. Bap aponta que a intenção do Tostes era alertar para a dificuldade que o poder público está criando para a construção da Arena, dificultando ao máximo a liberação das licenças e fazendo uma série de exigências que visam inviabilizar a construção nos moldes desejados pelo McDonald’s. Bap ainda levanta a questão de não haver um compromisso por escrito da empresa garantindo o investimento na construção, principalmente por ser uma negociação iniciada antes desta gestão, quando havia uma outra situação econômica e de negócio da empresa, que anda passando por uma crise agravada nos últimos 2 anos e que está fazendo o McDonald’s se reinventar, repensar seus investimentos e fechar lojas no mundo inteiro.
Aviso: Após estas entrevistas, o Póvoa soltou uma nota com várias críticas às 3 chapas, mas garantindo que o processo está andando em bom ritmo na esfera pública e que as negociações com o McDonald’s para a formulação do contrato estão em andamento e devem ser o mais breve possível apresentadas ao Conselho Deliberativo para aprovação.
Por fim, Bap praticamente encerra a entrevista anunciando que o vice-presidente de futebol será Landim caso a Chapa Verde vença as eleições em dezembro.
Nayra M. Vieira escreve no Blog Flamengo em Foco, da Plataforma MRN Blogs. Twitter: @NayraMV