A recente história do Maracanã é cheia de idas e vindas. Mais idas do que vindas. Com o passar dos anos o “Maior do Mundo” deixou de ser um estádio com um custo de operação baixo para os clubes cariocas e virou um estádio caríssimo depois que seu projeto arquitetônico foi adaptado ao famigerado Padrão FIFA.
Talvez a largada para o começo do fim do Maracanã como o havíamos conhecido tenha sido dez anos atrás. Ricardo Teixeira, até então presidente da CBF, já sabia que o Brasil seria escolhido como sede do Mundial de 2014. A seleção ainda disputava as Eliminatórias da Copa da África do Sul, quando o dirigente chocou a opinião pública com a declaração de que o Maracanã não poderia ser usado na eventual Copa do Mundo em terras brasileiras. Para o dirigente, atualmente na mira do FBI por corrupção e conspiração, o estádio deveria ser demolido e um outro construído em seu lugar.
A pressão surtiu efeito, antes ignorado pelo governador Sérgio Cabral, o dirigente logo foi chamado para uma audiência particular e saiu muito satisfeito com a “boa-vontade” demonstrada pelo executivo fluminense.
Meses depois, com a confirmação sem surpresas do Brasil como sede em 2014, o governador tratou também de anunciar a mais ampla reforma da história do Maracanã, que depois seria gerido por um consórcio.
Márcio Braga era o presidente do Flamengo à época. Ainda em 2005 ele conseguiu aprovação do prefeito César Maia para a um projeto de construção de um centro de lazer e entretenimento integrado a um novo estádio de 32 mil lugares. Os moradores da Gávea e adjacências fizeram pressão e os deputados estaduais aprovaram a Lei nº 3002/05, que determina que para construção de qualquer empreendimento imobiliário de lazer e entrenimento na Gávea seria necessária uma prévia autorização do Poder Legislativo Estadual mediante Projeto de Lei específico.
Em resumo, para que se construa algo na Gávea precisa-se de um deputado que assine um Projeto de Lei e o leve a votação na casa. Fácil, não?
Como se não bastasse, a Lei 3002/05 recebeu duas emendas em 2014, por conta da Arena Multiuso. O lobby da associação de moradores da região conseguiu aprovar mais dois empecilhos para o Flamango.
A primeira emenda aprovada acrescenta que, depois de todas as licenças, será obrigatório ainda ter uma audiência pública com a participação da sociedade civil, visando o debate com diferentes correntes de opinião.
A segunda emenda acrescenta a vedação para a construção de empreendimentos residenciais e shopping centers.
Parece ser impossível um estádio na Gávea. Talvez nem a Arena Multiuso seja aprovada, depois de todas as batalhas vencidas para obtermos as licenças.
Voltando ao passado recente de idas e vindas…
A pressão da torcida rubro-negra foi imensa com a notícia de que o governador, vascaíno, não teve boa vontade política para com o Flamengo. Pensando em seu eleitorado, Cabral recebeu Márcio Braga e o tranquilizou. O sonho de ter lutar por um estádio na Gávea foi demovido perante a promessa de Cabral de incluir no edital de escolha do consórcio que assumiria a gestão do Maracanã reformado — ou reconstruído –, em condições favoráveis para que o Flamengo pudesse concorrer ao leilão de escolha do consórcio administrador.
Márcio procurou o Fluminense para uma co-administração. Ainda em 2008, o ex-presidente trabalhou muito no sentido de se municiar com informações técnicas relevantes, que dariam suporte para a adoção de um modelo otimizado para o Flamengo. Em 2013, MB publicou carta explicando como se deu este processo:
“Inclusive, boa parte dos estudos de viabilidade, projeções econômico- financeiras e pesquisas de mercado para isso já foram feitos por Flamengo, Fluminense, CBF e ISG, em 2008, quando se trabalhava com a ideia de os clubes administrarem o estádio.
À época, por exigência do Flamengo, este grupo buscou a participação da AEG, maior empresa de conteúdo para estádios e arenas dos Estados Unidos, que pode viabilizar uma quantidade considerável de eventos no Maracanãzinho, transformando-o no grande diferencial para a geração incremental de receitas permanentes de todo complexo.
Hoje, ISG, braço da IMG, sócia de Eike Batista na IMX, se apresenta com 5% do Consórcio que pretende administrar o Maracanã, AEG com mais 5% e Odebrecht, que já recebeu mais de R$ 1 bilhão para fazer as obras, com 90%, sendo que, no modelo atual, ainda haveria obras no entorno com valor estimado em mais de R$ 500 milhões.”
Parece até lenda mas aconteceu de verdade. Sérgio Cabral acalmou Márcio Braga dizendo que o Flamengo iria administrar o Maracanã. A torcida (eleitorado) aquietou.
“Ele acreditou!”O tempo passou e quando o edital saiu os clubes receberam uma canetada proibindo a participação administrativa no lugar onde são os protagonistas do espetáculo. Salutar lembrar que, por conta da promessa de Cabral, o Flamengo desistiu da licitação do Engenhão, deixando o Botafogo sozinho, dias antes do prazo final.
Hoje abandonado, o Maracanã está aberto para festas de casamento, bailes de carnaval e shows de bandas internacionais. Futebol com os clubes do Rio? Talvez em outubro.
Com principal empresa do consórcio vencedor abarrotada de dívidas, prejuízos e auditorias, seu dono Marcelo Odebrecht preso por corrupção há mais de seis meses mandou demitir quase todos os funcionários. Do diretor-executivo Marcelo Frazão, passando pela assessoria de imprensa até chegar ao empregados responsáveis pela limpeza e segurança.
Nas idas e vindas o Maracanã serviu para seleções estrangeiras na Copa 2014, obrigou o Flamengo a jogar no estádio do Botafogo por anos, sugou o Flamengo a partir de 2013 com taxas altíssimas que impactaram diretamente o preço do ingresso, e criou um elefante branco no lugar do estádio conhecido e reconhecido em todo o mundo.