Ser técnico do Flamengo é dessas atividades que, em qualquer cenário, contexto ou ambiente, vão te exigir coragem. É uma torcida gigantesca, é um time que vive sob intensa cobrança, é, como bem disse Bruno Henrique, um clube que tem diversas páginas de Instagram.
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Você vai ser pressionado, você vai ser criticado, você vai ser comparado a Jorge Jesus, e, no caso de Rogério Ceni, vão roubar sua marmita de madrugada e você vai ficar tão traumatizado que mesmo quando for pra outro time não vai saber lidar com a camisa do Flamengo.
➕ JOÃO LUIS JR.: Manter Tite até a Copa do Brasil é esperar o paciente morrer pra trocar de médico
Isso, é claro, se você for um treinador cascudo, experiente, e assumir o Flamengo no começo da temporada, com tempo pra pedir reforços, treinar seu esquema e só for encarar um jogo decisivo dali a, vamos dizer, uns dois meses, e esse jogo for a final do Carioca, que é basicamente um interclasses com premiação menor.
Agora imagine o nível de coragem que um cidadão precisa ter pra, na sua primeira experiência como treinador profissional, pegar um Flamengo absolutamente mutilado, confuso, mal-treinado, e que tem, naquela mesma semana, um jogo de semifinal da Copa do Brasil pela frente.
Seria basicamente a versão esporte de você, assim que recebeu a carteira de motorista, pegar o volante de um caminhão tanque, já em movimento e pegando fogo, pra descer a Serra de Petrópolis sem freio, com duas crianças pequenas no banco de passageiro, as duas chorando bastante e reclamando que estão com fome.
Bem, é exatamente isso que Filipe Luís acaba de fazer.
E se a queda de Tite é a crônica de uma morte pra lá de anunciada, um trabalho ruim que não iria se salvar por conta de uma vitória sofrida contra um limitadíssimo Athletico-PR, ver o ex-lateral promovido ao time principal é uma solução ao mesmo tempo óbvia e surpreendente.
Óbvia porque não apenas a promoção do técnico da categoria sub-20 seria o caminho mais natural como Filipe Luís é possivelmente a única opção – além de Jorge Jesus – de treinador que chegaria tendo crédito com a torcida rubro-negra, um desses raríssimos casos de unanimidade numa torcida tão grande que raramente consegue concordar em alguma coisa.
Surpreendente porque, sendo Filipe um cara tão inteligente e que conhece tão bem o Flamengo, seria totalmente compreensível da parte dele recusar esse chamado, preferir se preservar, não querer pular etapas no que parece ser uma carreira tão bem planejada. E ainda assim, lá está Filipinho, assumindo como interino, no momento mais complicado do ano, um time sobre o qual existia tanta expectativa e que ofereceu tão pouco resultado.
E se Filipe Luís teve a coragem, cabe a nós oferecer o apoio e a paciência. Porque não, ninguém vai conseguir, em meia semana, consertar o Flamengo, resolver os problemas físicos, resgatar o Gabigol de 2019. Mas a saída de Tite e a presença de Filipe permitem que o rubro-negro finalmente, após meses num limbo de tristeza, passes por lado e coletivas torturantes, ao menos volte a sonhar, volte a acreditar, volte a ter esperança de que algo de bom ainda pode acontecer em 2024.
E numa temporada terrível como essa, isso com certeza não é pouca coisa.
João Luis Jr. é jornalista, flamenguista desde criança e já viu desde Walter Minhoca e Anderson Pico até Adriano Imperador e Arrascaeta, com todas as alegrias e traumas correspondentes. Siga João Luis Jr no Medium.
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