Uma análise sobre a multifuncionalidade: Arão foi o jogador que mais se transformou com Jorge Jesus, e hoje é o motor do Flamengo
Por Téo Benjamin
Willian Arão foi o jogador que mais se transformou com Jorge Jesus. Passou a ser, em um período curto, o motor que faz o jogo do Flamengo funcionar. A peça defensiva que permite que o time siga no ataque o tempo todo. Em 2019, Arão viveu três períodos distintos. Primeiramente, com Abel, jogava ao lado de Cuéllar em um 4-2-3-1, sendo o volante pela direita. Nessa dinâmica, ele subia sempre ao ataque ligado ao lateral (Pará) e ao meia pelo lado (Everton Ribeiro), enquanto Cuéllar ficavam mais preso.
Em segundo lugar, passou a jogar com Jesus junto a Cuéllar em um 4-1-3-2 ou 4-4-2. Aconteceu contra Athletico, Corinthians, Botafogo, Emelec, Grêmio, Vasco e Inter. Contra o Goiás em casa e Emelec fora, Arão começou e foi substituído por Cuéllar, já dando uma dica do que viria a seguir. Em seguida, diante da saída do colombiano, Arão passou a jogar ao lado de Gerson por dentro. Essa formação iniciou sua caminhada na vitória por 3×0 contra o Palmeiras no Maracanã e seguiu invicta até o fim do ano, rumo aos títulos do Brasil e da América.
O que os números dizem sobre as diferentes fases de Arão?
Antes de mais nada, ele sempre foi considerado importante. Foi o jogador que mais atuou no ano, com 66 aparições nos incríveis 76 jogos do Flamengo em 2019. Dos dez jogos que não jogou, sete foram ocasiões em que Abel optou por poupar o time quase todo (aliás, como poupava!). Além de entrar em campo muitas vezes, Arão jogava por muito tempo. Só ficou em campo menos de 90 minutos em 12 oportunidades.
O primeiro grande impacto de Jorge Jesus na vida de Arão foi relacionada à produção ofensiva. Com Abel, o volante tinha uma média de 0.12 gols, 0.2 assistências e 1.44 passes-chave por jogo.
Com JJ, 0.05 gols, 0.08 assistências e 0.46 passes-chave. Arão era usado antes como um homem a mais no ataque, apoiando o centroavante. Quando a jogada saía pelo lado esquerdo, ele infiltrava pela direita para virar quase um atacante. Por isso, tinha uma média de participação em gols tão grande para um volante. Quando saía pela direita, ele podia fazer a ultrapassagem por dentro ou por fora em busca do cruzamento. Era a “raquetada do Arão”, que simplesmente desapareceu com Jorge Jesus. Com Abel, 1.1 cruzamento por jogo, todos da mesma região. Com Jesus, apenas 0.35.
Apesar de não participar tanto da fase final do ataque, Arão passou a participar mais do jogo como um todo. Seu número total de ações por jogo aumentou 10%. O número de passes aumentou 15% e o de dribles aumentou 30%! O número de bolas perdidas caiu 30%.
Mas certamente a maior mudança foi no seu senso de posicionamento e leitura global do jogo
Arão deixou de ser intenso por correr atrás da bola o tempo todo e passou a ser intenso por estar sempre no lugar certo na hora certa, realizando — e acertando — mais ações no jogo.
“O impacto do Jesus foi muito grande. Eu já tinha jogado como primeiro volante, mas quando ele chegou e começou a me pedir alguns movimentos, foi uma mudança muito grande para mim. Eu não entendia o jogo daquela forma, não entendia as movimentações daquela forma.”
Seu posicionamento, de fato, melhorou muito. Mais bem colocado, passou a entrar em menos bolas divididas. O número total de disputas (pelo chão e por baixo, com bola e sem bola) caiu 14% e a taxa de vitória nesses duelos subiu de 49% para 57,6%! Arão passou a tentar 26% menos desarmes, mas a taxa de acerto subiu de 44% para 56%. O número de bolas soltas recolhidas por ele aumentou 15%
No entanto seu grande trunfo é mesmo nas interceptações. Arão sempre foi bom no quesito, mas se tornou extraordinário. Sob comando de Abel, ele realizava 4.4 interceptações por jogo. Um número já um tanto alto. Já com Jesus, especialmente logo depois da saída de Cuéllar, esse número passou para 5.5. Com um pequeno detalhe: 38% das interceptações de Arão são no campo de ataque.
Se realizava 4.4 interceptações por jogo com Abel, por mais que o número já seja um tanto alto, com Jesus, especialmente depois da saída de Cuéllar, esse número passou para 5.5. Com um pequeno detalhe: 38% das interceptações de Arão são no campo de ataque. O homem virou uma máquina de recuperar a posse já no campo ofensivo quando o Flamengo força o adversário ao chutão! Sempre no lugar certo, na hora certa.
O time como um todo, é claro, tem mérito
Nesse sentido, o meia disse: “Além do meu posicionamento, tem o posicionamento dos meus companheiros. Não adianta nada eu estar bem posicionado e o cara do meu lado estar mal posicionado. O time vai ter que correr 30 ou 40 metros a mais.”
Colocando em perspectiva… Cuéllar realizava 4.2 interceptações por jogo, sendo 17.9% no campo de ataque.
Lindoso (Inter) = 5.7 interceptações por jogo – 22% no campo de ataque
Michel (Grêmio) = 4.4 – 20%
Felipe Melo (Palmeiras) = 5.7 – 21%
Pituca (Santos) = 3.8 – 28.9%
Leia também: Como Gabigol marca seus gols? Entenda padrões, qualidades e posicionamento do atacante do Flamengo
Gerson realizou 39.4% das interceptações no campo de ataque, mas são só 2.9 por jogo. Sánchez (Santos) chega a 45.3%, mas em 1.9 interceptações por jogo. Arão intercepta tanto quanto um ótimo primeiro volante e o faz no campo de ataque tanto quanto um grande segundo homem. Mesmo que abrindo mão de sua vocação ofensiva, Arão se tornou um volante para ninguém botar defeito. Ele ainda erra, é claro. Mas quem não erra? Arão está em um nível altíssimo para o futebol brasileiro e é bom que se diga: vem errando cada vez menos.
Os números são cada vez mais importantes, mas não dão conta de tudo no futebol. Talvez a principal característica de Arão com JJ nem apareça nas estatísticas. Afinal, ele se tornou um jogador multifuncional que ajuda no equilíbrio do time como um todo, principalmente sem a bola. Os “dados de evento” só mostram as ações ao redor da bola.
Quando Arão se posiciona bem, acompanha um adversário no tempo certo ou faz uma boa cobertura pelo lado direito, por exemplo, evitando que o adversário opte por atacar por ali, isso não é mostrado nos dados. Sua mudança de posição foi sutil. A mudança de função, alterando suas movimentações, foi importante. A principal transformação foi na maneira como lê e controla os espaços.
Willian Arão hoje permite que o Flamengo ataque o tempo todo. Assim, se tornou imprescindível.
Complemento: explorando melhor a participação de Arão na saída de bola e na construção do jogo ofensivo do Flamengo
Jorge Jesus gosta de usar a “saída de três” em algumas situações para conseguir superioridade numérica contra o adversário logo na saída de bola. Com isso, Arão recua entre os zagueiros para iniciar o jogo junto com eles e com o goleiro. Com o tempo, ele foi se acostumando e ficando mais confortável nesse posicionamento. Um movimento mal feito de recuo para tomar o lugar de um zagueiro avançando, inclusive, foi a origem do “Tá mal, Arão”, mas esses elementos foram sendo incorporados ao seu jogo de forma natural.
A mudança na sua dinâmica de jogo fica claríssima quando comparamos a região do campo de onde se originavam seus passes com Abel Braga e com Jorge Jesus no comando. Menos passes no ataque, mais passes na defesa e uma enorme participação no meio-campo.
Uma opção extremamente confiável para virar o jogo
O primeiro passe para iniciar a jogada é fundamental. No momento em que a bola sai limpa lá de trás, vai desorganizando o adversário e a jogada consegue chegar limpa lá na frente. Mesmo jogando recuado, Arão é fundamental para a fluidez do ataque rubro-negro.
O segredo nessa etapa é paciência. Às vezes, a bola circula de um lado para o outro até encontrar a brecha para avançar. Com isso, a quantidade de passes feitos por Arão por jogo aumentou 15%, mas o percentual de passes para frente caiu de 77% para 73%. Mesmo com um percentual um pouco menor, em números absolutos, Arão dá mais passes para frente com Jesus (39 por jogo) do que dava antes (35.8). O percentual de acerto, que já era muito bom, subiu um pouco, de 89.7% para 91.9%.
Leia também: Um Flamengo que não abdica da sua forma de jogo
Conforme o Flamengo avança e se estabelece no campo de ataque, forçando o adversário a recuar, Arão se desgruda dos zagueiros e passa a ser uma opção de passe pelo meio para girar o jogo. Aí vem a maior diferença nas estatísticas e a principal melhora técnica trazida por Jorge Jesus: o passe longo. Arão fazia 0.7 passes longos por jogo com Abel e passou a fazer 1.2 com Jesus. O mais impressionante: acertava 70% e passou a acertar 93%!!!
Ele virou uma opção extremamente confiável para virar o jogo de um lado para o outro, variando a forma de atacar e tentando pegar os adversários desprevenidos. Com essa nova ferramenta em seu repertório, Arão foi se tornando cada vez mais importante. Por fim, se hoje o seu maior destaque é o controle dos espaços no meio-campo sem a bola, podemos dizer também que com bola o camisa 5 vem se tornando cada vez mais completo. Tá bem demais!
*Créditos da imagem destacada no post e nas redes sociais: Marcelo Cortes / Flamengo
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