Após vencer o Sporting Cristal na estreia atuando no Peru, o Flamengo fez o dever de casa e conquistou sua segunda vitória na Taça Libertadores ao derrotar o Talleres.
Entre altos e baixos, o Mais Querido conseguiu apresentar grande progresso com bola em relação às últimas quatro partidas na temporadas. Mas ainda segue com problemas defensivos que, em parte, são de responsabilidade dos jogadores, bem como do técnico Paulo Sousa.
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Os primeiros 25 minutos de duelo foram intensos e com propostas bem claras. O Talleres optou por uma marcação mais agressiva na saída de bola do Flamengo e com variação tática importante.
O técnico Pedro Caixinha optou por atuar com uma trinca de meias e mudou a formatação inicial usada contra a Universidad Católica. Ao invés do 4-2-3-1/4-4-2, a equipe argentina começou no 4-3-3 com o volante Oliva no lugar do ponteiro Martino. Com isso Esquivel e Fértoli formaram o ataque com Girotti.
A ideia de “La T” era gerar igualdade numérica na saída de bola do Flamengo variando uma marcação por pressing (subidas de pressão individualizadas) com uma pressão por zona em bloco médio/alto. O Fluminense adotou uma postura parecida na segundo jogo da final do Estadual e obteve êxito.
Nos primeiros cinco minutos de jogo o Talleres chegou a ser levemente superior, conseguindo pressionar a posse do Fla e gerar volume ofensivo pelo corredor lateral direito.
Porém, o futebol não é feito somente de conceitos. A execução do plano de jogo é essencial para o bom funcionamento de uma equipe. Apesar do cenário parecido do clássico, o Flamengo conseguiu ser muito mais assertivo nos primeiros 25 minutos de jogo.
E isso passa muito pela boa atuação com bola dos jogadores que formam a saída de três. Mesmo pressionados, Arão, David Luiz e Filipe Luís encontravam janelas e acertaram seus companheiros mais a frente. Forçando menos as ligações longas para Gabi e Bruno Henrique e encontrando João Gomes, Everton Ribeiro e Arrascaeta em associações mais curtas.
Em um desses passes de ruptura, Arão iniciou a jogada do primeiro gol do Mengão. Aos 11 minutos, o volante identificou Everton Ribeiro baixando na linha dos volantes e acionou o camisa 7. O meia girou o jogo para o lado esquerdo, que foi acelerado com Gabi e Arrascaeta. O uruguaio foi derrubado na área e o “Príncipe da Gávea” abriu o placar cobrando o pênalti com a categoria de sempre. 1×0.
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Com Arrascaeta e Bruno Henrique em “papeis invertidos”, Flamengo amplia
Mesmo após abrir o placar o Flamengo seguiu buscando ter a bola e o Talleres tentando pressionar a primeira fase de construção rubro-negra com pelo menos cinco jogadores. Arão continuou acertando passes importantes por dentro, encontrando João Gomes e Everton Ribeiro bem posicionados. A equipe conseguia progredir com bola até o último terço, com fluidez e se aproveitando dos espaços cedidos pelo adversário.
Além disso, o posicionamento de Bruno Henrique e Arrascaeta chamou a atenção. Ao invés de BH majoritariamente gerar amplitude como ala e Arrasca ser um meia interior, a dupla teve “papeis invertidos” em alguns momentos. De modo que o atacante por vezes trabalhava mais centralizado e o meia mais aberto (sem gerar a mesma amplitude).
Esse comportamento foi predominante, em especial, nos momentos em que o Talleres subia mais suas linhas de marcação e gerava espaços às costas para serem atacados. Seja em ataque posicional ou em transições ofensivas, Bruno Henrique gera mais impacto sendo acionado mais próximo ao corredor central e, consequentemente, mais próximo do gol.
E nessa formatação o Flamengo ampliou o placar. Ao invés de Arão, David Luiz acertou um passe na janela encontrando Arrascaeta. O uruguaio rapidamente se associou a BH, atacando às costas do lateral Benavides e progrediu pelo setor para achar Everton Ribeiro na meia-lua, que marcou seu primeiro gol no jogo aos 25 minutos da etapa inicial. 2×0.
Apesar de melhor compactado, Flamengo ainda sofre com problema na coordenação das linhas de marcação
Se com bola o Flamengo fez uma primeira etapa animadora, no momento defensivo alguns problemas voltaram a acontecer. Assim como na vitória sobre o Cristal e o empate contra o Atlético-GO, Paulo Sousa optou por utilizar um meia cobrindo o lado direito para que a equipe pudesse se defender em 4-4-2 em bloco médio.
Nessa formatação o Flamengo conseguiu ser mais compacto e se protegeu de uma forma correta do Talleres, gerando certo constrangimento aos zagueiros adversários com a dupla de ataque e protegendo os corredores laterais com encaixes individuais por setor. As entrelinhas era vigiadas por João Gomes e Thiago Maia que, ora saltavam nos meias argentinos, ora protegiam suas costas.
Porém, em alguns momentos, a equipe voltou a marcar em 4-3-3 buscando pressionar a saída de três do Talleres com o avanço de Arrascaeta. Com gatilhos de pressão bastante longe do ideal, o trio de frente pouco gerava constrangimento na saída de bola argentina e permitia que ela chegasse limpa a uma zona frágil para este tipo de formação: o corredor lateral na altura dos meias.
Teoricamente esta região é um espaço vital que pode ser explorado pelo adversário caso a equipe não possua mecanismos para mitigar a facilidade com que os laterais/alas podem receber bolas descobertas.
Sendo assim, a postura do Flamengo para solucionar essa questão ainda é frágil. Quando o adversário recebe nesta região do campo, após vencer a pressão inicial dos atacantes rubro-negros, um movimento descoordenado da linha de meias e defensores gera grandes espaços nas entrelinhas: Enquanto os volantes sobem pressão na região da bola, a última linha não acompanha esse movimento, somado ao espaçamento, se torna muito grande entre os setores.
Isso fica muito claro no gol de honra do Talleres. Villagra recebe passe no corredor lateral após Catalan encontrá-lo numa diagonal longa pouco constrangida pela trio de frente. O trio de meias sobe pressão no volante e a linha defensiva segue afundada próxima a entrada da grande área.
Com o grande espaço dado aos volantes, Méndez ataca a região e recebe livre para acionar Girotti e o centroavante, de calcanhar, servir Fértoli para descontar já no fim do primeiro tempo. 2×1.
Flamengo assume postura mais conservadora na segunda etapa e chega a seu terceiro gol
Novamente com uma vantagem mínima no confronto, o Flamengo voltou ao segundo tempo num bloco médio sem subir pressão com três jogadores. Dessa forma a equipe predominantemente marcou em 4-4-2 com Bruno Henrique de volta ao corredor lateral esquerdo.
Com a bola, a equipe tinha maiores dificuldades para progredir no campo pela menor assertividade nos passes. Tanto do trio de zaga, como da dupla de volantes João Gomes e Thiago Maia. Apesar disso, o Flamengo conseguia reter a bola e “se defendia” girando-a com passes laterais.
Logo no início da segunda etapa, Caixinha promoveu três mudanças no Talleres buscando o empate. O volante Oliva deu lugar ao atacante Michael Santos e os ponteiros Valoyes e Martino entraram nos lugares de Esquivel e Fértoli. A ideia do treinador português era de pesar a área com mais um jogador e forçar o jogo em cima dos laterais Rodinei e Filipe Luís.
A ideia ofensivamente pouco gerou impacto e defensivamente causou um grande problema. Com menos um homem no meio campo o Flamengo conseguia encontrar os espaços às costas dos volantes com maior facilidade. Numa dessas associações, o Mengão chegou ao terceiro gol.
Aos 15 minutos da etapa final, Everton Ribeiro tabelou com Bruno Henrique e atacou primeiro, gerado por Gabi nas costas de Méndez. O meia finalizou rasteiro no canto de Herrera para dar números finais ao duelo. 3×1.
Pedro entra bem no final e quase marca
Com um meio campo mais despovoado e sem o mesmo ímpeto para pressionar o Flamengo, o Talleres se tornou um presa fácil no fim da partida. Paulo Sousa promoveu mudanças visando tirar alguns amarelados e renovar fisicamente a equipe.
Logo após o terceiro gol, Andreas Pereira e Léo Pereira entraram nos lugares dos pendurados Filipe Luís e Thiago Maia. Quinze minutos depois, Marinho e Pedro entraram no lugar dos extenuados Gabi e Bruno Henrique.
A equipe seguiu com a mesma formatação ofensiva, porém um centroavante que pode ser acionado em profundidade. Tanto pelos apoios frontais (pivôs) gerados, bem como pela vitória pessoal que pode ter sobre os zagueiros por conta da questão física. Ligado na partida, Pedro quase marcou em duas oportunidades e mostrou que pode dar ao Mister uma opção diferente de Gabi no comando do ataque.
Apesar dos problemas defensivos, Flamengo volta a apresentar margem de evolução
Ainda em início de temporada, o Flamengo fez seu quarto jogo por uma competição de nível ao menos nacional em 2022. O período de pré-temporada não apresentou a evolução que tanto Paulo Sousa quanto a torcida rubro-negra esperavam no início de seu trabalho no clube.
Apesar disso, nos últimos três jogos foi possível enxergar uma equipe evoluindo processos dentro de campo, em especial com bola, executando melhor alguns dos conceitos do treinador português. Nesse sentido, algumas adaptações já podem ser vistas visando o melhor desempenho de alguns atletas.
Os problemas sem bola continuam latentes e precisam ser corrigidos, tanto na execução dos jogadores, como no plano de jogo do Mister. Mas ainda há tempo para serem sanados visando os principais desafios da temporada.
Enfim, é muito cedo para tirar qualquer tipo de conclusão, porém já é possível enxergar um Flamengo progredindo coletivamente e começando a convencer.
SRN
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