Mais do que voltar às semis da Libertadores, o Flamengo voltou a assustar. Nossa camisa hoje cintila como o vemos em nossos sonhos.
“Para o Flamengo a camisa é tudo. Já tem acontecido várias vezes o seguinte: – quando o time não dá nada, a camisa é içada, desfraldada, por invisíveis mãos. Adversários, juízes, bandeirinhas, tremem, então, intimidados, acovardados, batidos. Há de chegar talvez o dia em que o Flamengo não precisará de jogadores, nem de técnicos, nem de nada. Bastará à camisa, aberta no arco. E diante do furor impotente do adversário, a camisa rubro-negra será uma bastilha inexpugnável.”
Nelson Rodrigues assim definiu magistralmente a mítica do nosso Manto Sagrado. Comecei esse texto com esse trecho de sua famosa crônica porque por anos a fio levamos essa definição tão a sério, que chegamos a escalar jogadores tão nitidamente inaptos a vestirem nossa nobre vestimenta que talvez tivesse sido melhor deixar só a camisa lá aberta em campo mesmo e torcer para que a mágica acontecesse.
Foram anos e anos escalando elencos sofríveis que fizeram a maior torcida do universo e arredores passar por torturas e vexames mil que nos levaram a um nível de descrença quase irreversível sobre a nossa inata vocação de sermos imbatíveis por simplesmente sermos quem somos e vestirmos nossas cores.
Pois bem, eis que esse tempo acabou.
A noite de ontem no Beira-Rio foi histórica. Mas não me embeveci e enlouqueci com a importante classificação como se fosse uma conquista. A noite e o avançar para a próxima fase foram históricos por marcarem a confirmação do que vem se desenhando nos últimos anos: o Flamengo se reencontrou com sua vocação protagonista de ser temido em qualquer relvado em que se apresente.
Escrevi aqui mesmo nesse espaço quando muita gente soberbamente desprezava a importante campanha que culminou no vice-campeonato da Copa Sulamericana 2017 — “Ai, Pedro, é a Série B das Américas!” — que nosso time, depois de tantos anos afastado dos holofotes em se tratando de competições internacionais, precisava criar casca nesse tipo de torneio. Precisava jogar sempre, chegar sempre, para se colocar novamente entre os favoritos não apenas por se chamar “Flamengo” mas por se apresentar como o que se espera do Destruidor Flamengo.
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A evolução alcançada jogo a jogo, ano a ano, após a reestruturação institucional implementada, através da melhoria de infraestrutura, de cada contratação impactante, da aposta em bons treinadores estrangeiros como Reinaldo Rueda e — sobretudo — Jorge Jesus, chega agora ao capítulo em que estamos.
Trinta e cinco anos depois da geração Zico — nossa geração bíblica — estamos novamente entre os últimos quatro clubes que disputam a mais importante competição do nosso continente. E num ano que não são quatro quaisquer: estamos falando de Boca Júniors e River Plate, os gigantes argentinos, e do Grêmio, o brasileiro de maior sucesso nesse tipo de torneio nos últimos anos.
Não ganhamos nada ainda. Na verdade, falta muito. Mas, mais do que o resultado impactante conquistado ontem — que confirmou a quebra da maldição que nos possuiu nas últimas décadas —, o que nos chama atenção é o espírito dessa equipe. São os olhares compenetrados de cada jogador, ineditamente competentes do goleiro ao centroavante como não me lembro de ter visto o Flamengo ter em muuuuuuuuito tempo. É a organização tática implementada pelo treinador português, onde cada um parece saber exatamente o que fazer, além de apresentar variações necessárias a desatar os nós que surgem dependendo da postura adversária. É a mentalidade controlada, que varia entre a frieza calculista e a fundamental erupção emocional nos momentos certos. É o talento individual que surge em favor do coletivo.
Mais do que voltar às semis da Libertadores, o Flamengo voltou a assustar. O vermelho e preto de nossa camisa hoje cintila como o vemos em nossos sonhos e nossos sonhos vêm jogo a jogo se mostrando cada vez mais realistas.
Chegou a hora, irmãs e irmãos rubro-negros. Nossa fé não se mostra mais infundada e cegamente passional.
O Flamengo acordou. Portanto ajoelhem-se adversários. Estamos aqui para atropelar.
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