Reestruturação do Flamengo norteou debates na Business FC: encontro fomentou mudanças no cenário do futebol brasileiro
MRN Informação | Diogo Almeida – Twitter: @DidaZico
A gestão atual do Clube de Regatas do Flamengo ganhou o título de melhor gestão de clubes em 2014 e o bicampeonato na competição de clube mais transparente do Brasil. As taças foram entregues ontem, durante o seminário Business FC, realizado pela plataforma esportiva Brasil Sport Marketing, uma iniciativa da Pluri Consultoria, Trevisan Escola de Negócios e Fanclub Live Marketing.
Durante toda a segunda-feira (11/05), no teatro do SESI, Avenida Paulista, 1313, os principais gestores do futebol brasileiro, além de jornalistas, pensadores e estudantes de marketing e gestão discutiram e apresentaram tendências e propostas para o principal esporte do país. O evento contou com 6 painéis de discussões e uma área de negócios exclusiva para networking entre alguns clubes e empresas interessadas em investimentos. No intervalo entre os painéis, foram entregues prêmios concedidos pela BrSM.
O primeiro Painel discutiu a urgência da profissionalização do futebol no Brasil, a preocupação com o Campeonato Brasileiro como produto e a premência de se criar uma Liga Nacional. Contou com as presenças de Rodolfo Kussarev, presidente do Red Bull Brasil; Jorge Avancini, diretor de mercado do Bahia; Toninho Nascimento, jornalista e ex-secretário nacional de futebol e defesa dos direitos do torcedor do Ministério dos Esportes, e Edu Gaspar, gerente de futebol do Corinthians. Paulo Vinicius Coelho moderou o debate, que girou em torno de práticas de governança corporativa, a falência do atual sistema político, a transparência e responsabilidade orçamentária, a necessidade de separação entre política e gestão, bem como a ingerência política sobre o trabalho dos gestores.
Jorge Avancini explicou como o Bahia instituiu seu modelo de governança, com mudanças estatutárias e a remuneração do presidente do atual presidente do clube baiano. Avancini instituiu um comitê gestor formado por 2 representantes eleitos, dirigentes de fato, e 3 executivos contratados.
Intermediado por Mauro Betting, a dificuldade de atrair e reter patrocinadores foi a tônica em discussão no segundo painel da manhã. Fábio Wolff, da Wolff Sports & Marketing, Bernardo Pontes, executivo de marketing do Vasco e Daniel Tiraboschi, diretor-executivo da Baruel, falaram sobre ativação de marketing e a dificuldade em posicionar os jogadores e comissões técnicas sobre a necessidade de participação efetiva em ações de live marketing. “Há mesmo muita dificuldade em trazer o jogador para protagonizar uma ativação. Eles não perceberam ainda a importância que uma ação tem para o ciclo de negócios no futebol”, confessou o diretor-executivo.
O relacionamento sobre a base de torcedores, a questão exposição x endosso de marca, os impactos da crise econômica e o papel do clube na entrega daquilo que o parceiro comercial foram temas tratados neste segundo painel.
Fábio Wolff, conhecido pelo arranjo de patrocínios pontuais, contou uma história curiosa sobre a relação de um determinado clube com um patrocinador que acabara de assinar um contrato por várias temporadas: “O clube precisava fazer uma grande quantidade de camisetas para uma ativação de patrocínio. Eles fizeram a estampa sem consultar a empresa e ainda entregaram as camisetas dentro de um saco de lixo preto, sem a menor cerimônia! Na mesma hora o diretor da empresa me ligou e disse que o vínculo não se renovaria ao término do contrato. O clube perdeu um bom patrocinador por causa de um detalhe. Mas é algo que mostra como os clubes brasileiros pecam nas pequenas ações de relacionamento com seus patrocinadores”..
Sem dúvidas, o painel mais rico do evento. Diversas ideias sobre o papel do jogador nas ações de marketing foram exemplificadas. Tiraboschi confessou que se sentiu encantado pelas opções que o Barcelona lhe deu para ativar a Baruel. “Eu realmente me encantei com o Barcelona. A lista de ações que eu poderia optar era enorme, um caderno. E a cada ação a mais escolhida, mas alto meu investimento ficava! Então eu acho que os clubes brasileiros precisam evoluir muito. E as empresas também, nesta questão do relacionamento entre as marcas. O Barcelona e a Baruel entendem que não adianta apenas uma exposição”. O executivo também aprova, em determinadas circunstâncias, o patrocínio pontual.
Fabio Wolff ironizou a tentativa de esconder as placas da Allianz no estádio do Palmeiras. “Ridículo, fere em demasia o negócio do futebol. E, particularmente nesse caso, a marca da Allianz foi seguramente mais pronunciada, ou seja, a CBF e sua parceira deram um tiro no pé. Mas não subtrai muito a perda que os clubes têm. De qualquer forma, como uma outra empresa pode querer investir em Naming Rights assim? O vôlei sofre com isso também”.
O Painel 3 trouxe à tona a perda da capacidade de investimento dos clubes e contou com o advogado Bichara Abidão Neto, sócio da Bichara e Motta advogados; Fernando Ferreira, sócio da Pluri Consultoria, Ricardo Borges Martins, diretor do Bom Senso FC (já entrevistado por aqui no blog Ninho da Nação), e Pedro Daniel, da BDO Consultoria. Moderado por Fernando Trevisan, o painel esclareceu pontos sobre a nova norma da FIFA sobre direitos econômicos de jogadores. “No curto prazo acredito que haverá uma debandada de bons jogadores do Brasil para a Europa. Sem investidores, os clubes têm muito pouco recurso para segurar novas promessas. Além disso, o preço de venda vai cair. Essa norma favoreceu muito os clubes de fora”, explicou Pedro Daniel.
A necessidade de novas fontes de receitas e o clube-empresa como solução para uma administração ágil também foram foco de debates. Outro ponto foi a Lei de Responsabilidade Fiscal dos Clubes. O Flamengo está à frente, com a Lei de Responsabilidade Fiscal Rubro-Negra, aprovada há semanas, sem a necessidade de uma regulamentação do Estado. O diretor do movimento Bom Senso FC ressaltou que a CBF parece não entender o conceito de institucionalidade: “Não há isso na MP! Por que simplesmente o clube tem a opção de aderir ou não ao acordo. Se aderir ele passa a responder pelo chamado fairplay financeiro. Em contrapartida, aproveita o refinanciamento das dívidas”. Todos no painel foram unânimes em elogiar o Flamengo, exemplar em seu modelo de governança.
O futuro dos estaduais e das federações de futebol era o tema do Painel 4, que começou com uma excelente explanação sobre o contexto histórico da organização do futebol brasileiro, pelo professor da FGV e Harvard Law School, Pedro Trengrouse. “Fica evidente que o modelo é ditatorial. Não é simplesmente o fato da existência ou não de federações e confederações. Mas como elas se posicionam. Com poderes perpétuos, como donas do futebol. No Rio, existem votos de entidades sem representatividade nenhuma. São dezenas de ligas amadoras sem endereço, por exemplo. O voto dos grandes é vencido. E essa coisa de arbitral… O Flamengo não tem obrigação de fazer algo prejudicial a ele só porque foi decidido no arbitral”, alertou Trengrouse, em um dos grandes momentos da noite.
No mesmo Painel, o CEO do Flamengo, Fred Luz, anunciou que o Flamengo luta pela criação de uma liga. E quando perguntado em tom de brincadeira, por Fernando Trevisan, sobre a possibilidade do Flamengo disputar o campeonato paulista em 2016, a resposta veio de maneira enfática: “O Flamengo é um clube do Rio. E sempre vai jogar o Estadual do Rio. O que a gente está lutando é por um calendário que não prejudique. O Estadual causa prejuízo financeiro ao Flamengo. Mas a gente entende que pode ser um bom produto, pois gera boa visibilidade ao clube”.
O Painel 5 deu voz aos administradores das chamadas Novas Arenas. Marcelo Frazão, executivo da Odebrecht Properties, e responsável pela diretoria de negócios da área de Entretenimento do grupo, afirmou que cada vez mais o Maracanã apoia ações de ativação dos clubes, como match days, e iniciativas contundentes das torcidas, como mosaicos. “A gente apoia a festa e entende que a paixão precisa aflorar através das diversas manifestações culturais. A gente não se opõe aos instrumentos musicais e às bandeiras, por exemplo. A gente quer uma festa bonita e cada vez mais aprende e incentiva”, declarou o executivo, que tem no currículo grandes projetos como o Lollapalooza Brasil e o Festival de Verão de Salvador.
Rogério Dezembro, diretor de negócios da WTorre falou sobre o valor dos ingressos. “Não tem como operacionalizar cobrando um ingresso de 10 reais. O novo estádio do Palmeiras tem 36 escadas rolantes, três dezenas de elevadores. O Cinema custa o mesmo valor de um ingresso e não vejo esse espanto todo”, disse.
Finalmente chegamos ao Painel dos Presidentes. Eduardo Bandeira de Melo, já laureado pelos títulos de Melhor Gestão em 2014 e clube mais transparente, conversou com presidentes de mais 3 clubes: Bahia, Grêmio e Chapecoense. O presidente do Fluminense, Peter Siemsen, foi aconselhado de última hora pelo jurídico do clube a não comparecer. Teme-se nas Laranjeiras, que depois do “castigo” imposto pela FFERJ, o presidente venha a receber maiores sanções por comparecer a um evento e falar como presidente. Por críticas feitas à Federação do Rio, o mandatário tricolor está impedido temporariamente de exercer o cargo.
Bandeira agradeceu novamente pelas diversas citações elogiosas ao Flamengo ao longo do dia e explanou sobre diversas assuntos referentes a presente gestão. Sempre com foco na responsabilidade administrativa. Disse que o sucesso em campo ainda não chegou. “Ontem a gente já perdeu, eu já estou ficando preocupado. Não dá mais pra ficar fugindo do rebaixamento todo ano”, confessou.
Grande vencedor da noite
Não apenas pelos 3 prêmios – Fred Luz foi eleito o melhor CEO do Brasil – e indicações em todas as categorias. O Flamengo era um norte nas discussões quando se precisava de um nome de clube brasileiro como exemplo. A Business FC, evento que reuniu imprensa e mercado em plena Avenida Paulista, coração da economia brasileira, se curvou perante os demonstrativos e indicações contábeis do Clube de Regatas do Flamengo, na dianteira em todos os quesitos referentes à boa governança e métodos de administração.
O Flamengo é um dos maiores cases de recuperação financeira do mundo do futebol. A grande torcida dos stakeholders presentes ao seminário era de que a bola precisa começar a entrar no gol e as vitórias da gestão entrem em campo, para legitimar a mudança no clube, diminuir a pressão da torcida e imprensa descompromissada e, acima de tudo, servir de exemplo para a esmagadora maioria do futebol brasileiro.