O MRN teve acesso à íntegra do texto que o vice-presidente de Patrimônio e primo do presidente Rodolfo Landim Arthur Rocha vai apresentar ao Conselho Deliberativo do Flamengo para regular o processo de possível transformação do Flamengo em SAF (Sociedade Anônima de Futebol). Se o texto for aprovado da maneira como está redigido atualmente, seria possível transformar o Flamengo em SAF com o voto de menos de 20% dos sócios do clube, algo entre 1.200 e 1.400 pessoas.
O projeto de Rocha, que está reunindo assinaturas para apresentar o texto para votação do Conselho Deliberativo, lista uma nova atribuição para a Assembleia Geral, que reúne todos os sócios com direito a voto no Flamengo e hoje só têm a função de eleger o presidente, o vice-presidente e os membros transitórios dos Conselhos Deliberativo e de Administração; e de deliberar sobre uma possível fusão com outra associação ou dissolução do Flamengo.
➕ Landim explica o que falta para projeto de SAF no Flamengo
Embora sem citar nominalmente a palavra SAF, o texto agora atribui à Assembleia Geral a votação sobre “qualquer alteração da natureza civil associativa do Flamengo, total ou parcial, seja pela sua transformação, cisão ou qualquer outro meio de partilhamento de seus ativos”.
Conselho Deliberativo perderia poder de estabelecer regras para criação da SAF
A mudança tiraria da esfera do Conselho Deliberativo qualquer possibilidade de barrar a transformação do Flamengo em SAF ou incluir regras limitadoras como a porcentagem máxima de participação que o Flamengo poderia vender ou a proibição de que atuais dirigentes assumam cargos na SAF.
Formado em sua maioria por sócios proprietários, o Conselho Deliberativo é supostamente um foco maior de resistência à mudança do que a Assembleia Geral, que inclui sócios de todas as categorias, inclusive alguns que nem torcem para o Flamengo e apenas fazem usos das dependências do clube, ou seja, estão menos interessados sobre o futuro do seu futebol.
O texto de Rocha estabelece que, para a votação da alteração da natureza civil associativa do Flamengo, ou seja, a criação da SAF, é necessário o quórum mínimo de 30% da Assembleia Geral. O número exato só é fechado pelo Flamengo às vésperas de cada eleição, mas se não houve grande flutuação desde 2021, ele é hoje de algo entre 6.000 e 7.000 sócios. Ou seja, algo entre 1.800 e 2.100 sócios teriam que participar da votação (a reeleição de Landim teve exatamente 2.011 votantes).
Para aprovar a mudança, seriam necessários os votos de dois terços desse quórum, o que daria um valor entre 1.200 e 1.400 pessoas. Ou seja, menos de 1.500 sócios do Flamengo, não necessariamente todos rubro-negros, poderiam determinar a transformação do Flamengo em SAF, seja mantendo o controle do futebol, seja com um investidor assumindo o controle do clube. Landim foi reeleito com 1.301 votos, mas eles só representaram 64,5% dos presentes.
Como seria a tramitação da emenda que abre caminho para Flamengo virar SAF
Se o texto proposto por Rocha for de fato protocolado no Conselho Deliberativo, o que deve acontecer nas próximas semanas, ele será submetido à Comissão de Estatuto do Conselho, formada por nomes indicados pelo presidente do órgão, Antônio Alcides, aliado de Landim.
Caberá a essa comissão escrever um texto final reunindo a versão original de Rocha, emendas propostas por associados e modificações sugeridas pela própria comissão. Toda essa tramitação deve durar cerca de 90 dias a partir do momento em que o texto for protocolado. A partir daí, teoricamente, poderia ser convocada, ao menos 40 dias antes, uma Assembleia Geral para transformar o Flamengo em SAF,
O MRN revelou a existência da emenda em uma reportagem exclusiva no último dia 13. Apesar de integrar a gestão Landim, Rocha vem apresentando a proposta como uma forma de tentar dificultar a transformação em SAF, e não facilitá-la. A própria proposta lista como primeiro objetivo das emendas “assegurar que qualquer mudança da natureza da associação do Flamengo, total ou parcial, seja submetida à vontade soberana da Assembleia Geral com ampliação substancial do plenário decisivo”.
Na visão do vice-presidente de Patrimônio, hoje, por ser assunto omisso não incluído no estatuto, a SAF poderia ser aprovada por maioria simples no Conselho Deliberativo sem necessidade de quórum – as reuniões do colegiado costumam reunir, quando muito, 400 associados, embora haja mais de 2.500 conselheiros. O discurso de Rocha já conseguiu convencer e coletar assinaturas de membros da oposição que se opõem à ideia de o Flamengo virar SAF, como Wallim Vasconcellos, Flávio Willeman e Ricardo Hinrichsen.
Outros nomes da oposição são mais reticentes e acreditam que não é o caso de introduzir o tema SAF no Conselho Deliberativo. Para eles, a ida do tema à Assembleia Geral já seria garantida pela Lei das SAFs, que faz essa exigência, e a atual redação do estatuto, que prevê que temas omissos sejam votados no Conselho Deliberativo, tornaria necessária a aprovação em duas etapas.
Apesar de o Flamengo, mesmo como associação civil, bater recordes de arrecadação, tendo chegado a quase R$ 1,4 bilhão de receita total e R$ 320 milhões de superávit, Landim argumenta que o Flamengo não pode comprometer sua saúde financeira no projeto de um construção de um estádio e defende a criação de SAF com a venda de uma parcela minoritária do controle do futebol do clube como forma de financiar a empreitada.
Para a oposição, esse seria apenas um pretexto para perpetuar o controle do grupo político de Landim, que não pode mais se reeleger, sobre o Flamengo.
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