Podemos dizer que tudo começou pelo gramado. Isso porque alguém na administração do Estádio Serra Dourada, possivelmente após acompanhar muitos jogos de tênis, decidiu que era meio sem graça que todos os campos de futebol fossem de grama e seria bacana se ao menos um fosse de saibro.
Daí a decisão de substituir cerca de 80% do gramado por areia pintada de verde, garantindo que o primeiro jogo de Flamengo e Atletico-GO no Brasileirão de futebol de campo fosse na verdade uma partida de beach soccer.
➕ A Libertadores já é complicada, a gente não precisa se complicar também
Depois entra a atuação do árbitro. Diante de uma partida confusa e de baixíssimo nível técnico, já que nenhuma das equipes teve tempo de trazer especialistas em futebol de areia como Junior Capacete, Claúdio Adão e Madjer, foi a vez do juiz, uma espécie de versão esportiva do personagem interpretado por Ben Affleck no filme “Garota Exemplar”, demonstrar uma incrível capacidade de parecer absolutamente mal-intencionado mesmo quando, dentro da regra, estava na sua razão.
Expulsou de maneira correta Jair Ventura antes dos 15 minutos de partida, após o treinador xingar até as vidas passadas do 4º árbitro e conseguiu ser criticado até por Tite. Marcou expulsão correta do zagueiro goiano que derrubou Pedro quando era o último homem e foi ameaçado até por torcedores já falecidos do Dragão.
Quando dessa falta, surgiu o golaço de Nico de la Cruz, numa cobrança daquelas que devem ter feito Zico sorrir e Petkovic entrar numa longa digressão sobre o regime soviético na Iugoslávia, a torcida rubro-negra imaginou que o pior já tinha passado, que a partida estava encaminhada, que era só jogar com seriedade e garantir o resultado.
Se esqueceu porém o torcedor que, ao contrário das acusações levianas de rivais menos espiritualmente iluminados, o Flamengo é sim o time mais honesto, gentil e boa praça do Brasil.
Gente boa a ponto de não fazer mais gols no time da colônia palestina do que o estritamente necessário e também, como ficou claro contra o Millionários pela Libertadores, honesto a ponto de se sentir culpado por ganhar de uma equipe que tem menos jogadores em campo.
Resultado? Um bisonho gol de empate sofrido, seguido de um pênalti absurdo de Léo Pereira, que o juiz marcou corretamente, mas mais uma vez com aquela falta de convicção que faz parecer que foi errado.
Depois disso ainda tivemos um gol do Atlético-GO anulado pelo juiz – também de maneira correta, mas a essa altura ninguém confiava nem que o árbitro se chamasse mesmo André – jogadores batendo cabeça de maneira tão literal que foram hospitalizados e um Flamengo absolutamente caótico, dependendo de chuveirinhos e chutões para tentar surpreender um adversário com apenas 10 em campo.
E foi aí, já nos acréscimos, que tivemos a emoção final: o pênalti a favor do Flamengo, que realmente aconteceu, mas acabou se tornando polêmico diante da decisão do juiz de gastar na frente do VAR mais ou menos o tempo necessário para assistir uma temporada inteira de Game of Thrones.
Pedro converteu, o estádio veio abaixo e até mesmo Vagner Love, que muitos imaginavam já ter se aposentado e hoje viver como instrutor de sexo tântrico no ABC Paulista, se revoltou e acabou levando um cartão amarelo.
Temos então a primeira vitória do Flamengo neste brasileirão, já na estreia, em condições no mínimo confusas.
Uma partida que possivelmente não serve de referência, pois normalmente o futebol é disputado em campos de grama, mas que acende sim, e mais uma vez, um alerta sobre a dificuldade que a equipe de Tite parece ter não apenas para dominar times em inferioridade numérica como também para matar partidas que já parecem definidas.
Vencemos, e é importante vencer. Mas meu Deus, precisava ser tão complicado assim?
João Luis Jr. é jornalista, flamenguista desde criança e já viu desde Walter Minhoca e Anderson Pico até Adriano Imperador e Arrascaeta, com todas as alegrias e traumas correspondentes. Siga João Luis Jr no Medium.
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