Nesta quarta-feira o Flamengo faz o primeiro de seus três jogos seguidos que, efetivamente, podem definir nosso 2018. Claro, ainda haverá o jogo de volta contra o Cruzeiro no fim do mês, mas é fato de que um mau passo inicial no Maracanã já faz o bolo desandar. Temos que vencer quarta pela Liberta, vencer no domingo para nos manter bem no Brasileiro e vencer o Grêmio no Maracanã para manter a moral elevada. Por mais que nosso goleiro seja bom pegador de pênaltis, é preciso admitir que o Dourado não vai poder bater os nossos cinco.
Confrades rubro-negros,
É raro eu abrir um texto de forma tão factual como esta, mas diante da verdadeira histeria arco-íris que presencio, desde a inócua chegada do São Paulo Football Club (é assim que se escreve?) à liderança transitória do campeonato. E fico particularmente gratificado ao perceber que há festa até entre rivais do próprio São Paulo (torcedores do Corinthians, time que, na definição imortal de Oswaldo Tinhorão, é um Fulham com coqueiros e torcedores do Palmeiras manifestaram prazer nas redes sociais). http://tinhorao.blogspot.com/2005/05/impresses-argentinas-sobre-flamengo-e.html
A justificativa: “Ora, ‘vocês’ estão enchendo o saco há rodadas falando em ‘segue o líder’”.
Bom, coincidentemente eu estava lendo, meio sem disciplina (como deve ser) um livro com três peças do britânico Oscar Wilde – uma bela edição da PenguimClassics: “A Importância de ser prudente”.
Não, o título do livro não tem absolutamente nada a ver com esta nossa resenha, e muito menos a ver com o espírito do Ser Flamengo – que é tudo, menos prudente. Aliás, eu diria que faz parte da composição do nosso ser a total ausência da prudência, um ativo necessário na coisa pública mas que no âmbito do rubro-negrismo se desvela em modorrenta pasmaceira. Não somos prudentes, não nos contemos e isso faz parte da nossa natureza de escorpião – e as tartarugas que estejam sempre disponíveis para nos ajudar a atravessar os rios. Que não sejam Carontes.
Mas me deparei, na divertida leitura da peça “Uma mulher sem importância” com uma bravata saborosa de Lorde Illingworth, respondendo a Lady Stutfield.
– O mundo diz que Lorde Illingworth é muito mau.
– Mas que mundo diz isso, Lady Stutfield? Deve ser o outro mundo. Este mundo e eu nos damos muito bem.
– Bom, todo mundo que eu conheço diz que o senhor é muito, muito mau.
– É monstruosoo modo como as pessoas hoje em dia saem por aí dizendo coisas contra nós, pelas nossas costas, que são absoluta e inteiramente verdadeiras.
Em outra peça, um outro personagem tão divertido quanto Illingworth pondera que “vulgaridade é apenas como chamamos a conduta de outras pessoas”.
O Flamengo é este lorde muito mau (pega um, pega geral) sobre o qual todos falam. Não se passa um dia sem falar sobre Flamengo, pelo menos o ser humano normal, não neurótico, pagador de boletos e com o C.A. no currículo. Mesmo o silêncio total é a presença Flamengo – por exemplo, quando um site de esportes que celebrou por dias e dias que “o Flamengo era o pior líder da história dos pontos corridos” resolve dizer “OS NÚMEROS DO SUCESSO” sobre um São Paulo que tem apenas UM ponto à frente, isto é falar do Flamengo. E pelas costas, coisas monstruosas – mas verdadeiras.
Este comportamento, que já sabemos ser vulgar, é algo inerente a quem recebeu a suprema maldição de não ser Flamengo. Vejam bem: um vascaíno que prefere perder os três pontos para o São Paulo como aconteceu domingo às centenas é só uma prova de que não há no mundo desportivo-político-social uma força mais efetiva que o Flamengo.
Mas como o arcoirismo não pode, de forma alguma, ser o principal assunto de um blog alojado no MUNDO RUBRO-NEGRO, é necessário voltar ao assunto principal (o de todos). Qual assunto? Ah sim, o Flamengo.
O jeito aqui é simplesmente tentar, em meio às demonstrações de lesa-pátria constantes, navegar entre o pessimismo controlado e o otimismo injustificado de nossas hostes. Estamos em segundo em um campeonato de pontos corridos, com UM ponto de diferença em relação ao primeiro colocado e algumas reações pareciam as de torcedores do Brasil na noite de 8 de julho de 2014 (mas sem os risos de então).
É mais do que óbvio que a Copa do Mundo prejudicou demais o Flamengo e os azuis precisam ficar atentos em 2022 para que isso (a Copa) não se repita. Considerando que a mesma será no Qatar, há alguma esperança. Mas é um verdadeiro absurdo que um torneio menor paralise as atividades de uma Nação do tamanho da Rubro-Negra.
A volta da Copa não trouxe só o São Paulo como antagonista – trouxe também o Internacional, que deve jogar uns nove jogos difíceis (inclusive contra nós) em casa. Considero, como alguns pessimistas, o “primeiro turno” (aspas, por favor) “perdido” (mais aspas), dado que São Paulo pega Sport (a maior baba do campeonato) e Chape em casa. Não perderá um ponto sequer. Já nós teremos tarefas mais espinhosas como o Cruzeiro e a aporrinhação de todos os anos, que é ir a Curitiba.
Ora, acontece que antes mesmo da Copa do Mundo nós já fazíamos este balanço de que agosto seria um mês de maratona, de desafios gigantescos. O futebol não é um vestibular para faculdade de fundo de quintal em que você pode passar com média 6 e escolher turno da manhã. Para que o Flamengo retome, com toda Justiça, o papel reservado apenas ao Flamengo, que é a Presidência do Universo (no momento, vaga por falta de perfis adequados), deve, sim, passar por essas provações. Ou vocês queriam oitavas da Liberta e da Copa do Brasil com Vasco, Fluminense e Botafogo?
E não interpretem erradamente o que vou escrever: no mundo ideal, ou seja, das ideias, não perdemos jogos. No mundo real, o sensível, isto vai acontecer. É um pouco vulgar? Quando acontece com os outros, sim. Mas com a gente o perder de jogos deve ser visto como uma espécie de aborrecimento passageiro, algo como não beber por causa de antibiótico ou subir dois lances de escada porque o elevador não veio.
Não, não estou, pelo amor de Zico, diminuindo a derrota. Se algum dos senhores me telefonar nos 10 minutos subsequentes ao fim de um jogo desses, podem acreditar que estarei defendendo até a depredação da Gávea. O que estou defendendo é que, dentro de um projeto maior, uma derrota para o Grêmio não prova muita coisa.
Prova que:
– Jogar um mata-mata na quarta a 200 por hora e, 70 horas depois, estar com 70% dos titulares contra um adversário totalmente descansado não vai funcionar;
– Precisamos de mais e mais elenco, porque não se pode entregar a rapadura no Brasileiro. Se o que temos não tem fôlego, por N motivos, para jogar três competições em alto nível por apenas três meses, que sejam incorporados mais jogadores.
Não prova que:
– Jogar sem Diego é fatal, porque já jogamos vários sem Diego e faturamos;
– Está tudo perdido em 2018.
Então, minha gente, o negócio é esse. Temos duas semanas simplesmente decisivas, precisamos levantar a cabeça (se é que ainda há alguma abaixada) e entender que esse negócio de ganhar de ponta a ponta, de não perder jogo algum, de ser atropelador, isso é coisa para time Wannabe. O Flamengo já é gigantesco e opressor sem precisar utilizar de nenhum desses expedientes ou ativar nenhuma dessas qualidades. Por suas características celestiais, o Flamengo exige de seus fiéis a resistência ao perrengue, a disposição para a vida e o bom combate, a perseverança dos vikings. Quem quer torcer para Real Madrid em campeonato espanhol que vá se distrair em chás beneficentes ou distrair-se apostando no cavalinho malhado da Bozo Corrida. Vamos cobrar, sim, que a diretoria trate essa maratona com mais profissionalismo, com os tons de guerra que enfrentaremos (sim, seremos combatidos incessantemente), mas vamos também tratar de torcer pelo Flamengo que é o que nos faz estar todos aqui dentro deste gigantesco transatlântico, que gela o coração dos mais malvados icebergs.
Saudações rubro-negras.
Imagem destacada nos posts e nas redes sociais: Gilvan de Souza / Flamengo
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Gustavo de Almeida é jornalista desde 1993, com atuação nas áreas de Política, Cidades, Segurança Pública e Esportes. É formado em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense. Foi editor de Cidade do Jornal do Brasil, onde ganhou os prêmios Ibero-Americano de Imprensa Unicef/Agência EFE (2005) e Prêmio IGE da Fundação Lehmann (2006). Passou pela revista ISTOÉ, pelo jornal esportivo LANCE! e também pelos diários populares O DIA, A Notícia e EXTRA. Trabalhou como assessor de imprensa em campanhas de à Prefeitura do Rio e em duas campanhas para presidente de clubes de futebol. É pós-graduado (MBA) em Marketing e Comunicação Empresarial pela Universidade Veiga de Almeida. Atualmente, escreve livros como ghost-writer e faz consultorias da área de política, além de estar trabalhando em um roteiro de cinema.
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