A “chorosa” comemoração de Vinícius Jr., após o belo gol que selou a amassada aplicada no Botafogo sábado passado, e a controvérsia que dela decorreu, inflada por várias manifestações de inconformismo seletivo, acabou galvanizando as repercussões e as discussões acerca do que aconteceu naquela tarde em Volta Redonda.
No entanto, algo relevante também se deu na partida. A efetiva estreia de Henrique Dourado com o Manto Flamengo. Sim, porque segundo consolidado adágio popular, jogador que veste a 9 (ou 19, 99, como queiram) somente estreia quando efetivamente vai às redes. E o nosso raçudo Ceifador precisou de menos de uma hora para abrir os trabalhos e começar a entregar o serviço para o qual foi contratado. Augúrio de êxito? Cedo ainda.
No blog: O Clássico, a mídia e o torcedor
De qualquer forma, escaneando alguns exemplos de estreias semelhantes, pode-se montar uma lista interessante de atacantes de área que também “chegaram chegando”. Uns foram vencedores no Flamengo, outros foram além e ganharam a idolatria. Muitos outros, no entanto, acabaram ficando pelo caminho.
E é essa lista, construída em ordem cronológica, que compartilho agora nas próximas linhas.
Prazer, eu sou o 9
1 – NUNES, Flamengo 2-2 Ponte Preta, Campeonato Brasileiro 1980
Tendo iniciado a temporada sem um centroavante de ofício no elenco (Cláudio Adão, brigado com Coutinho, treina em separado, o jovem Gérson Lopes lesionou-se nos amistosos da pré-temporada e os garotos Anselmo e Ronaldo ainda estão “verdes”), o Flamengo vai ao mercado e acerta a contratação de dois nomes de peso: Roberto Dinamite, que não se adaptou ao Barcelona-ESP, e Nunes, por empréstimo junto ao Monterrey-MEX. Mas a (esperada) intervenção do Vasco acaba melando a vinda de Roberto, e assim Nunes se torna o dono da Camisa 9. Sem demonstrar o mais remoto sinal de hesitação, Nunes exala confiança a cada entrevista, sem temor da pressão advinda de suas declarações fortes. “Vim aqui para fazer história e deixar meu nome marcado”. A estreia se dá na última partida da Primeira Fase do Brasileiro, contra o bom time da Ponte Preta (vice-campeão paulista), no Maracanã. Nunes, apesar da falta de ritmo, exibe incessante movimentação, marca um belo gol e, numa bonita tabela, deixa com açúcar uma bola para um gol de Zico. Apesar do desapontamento com o empate, Nunes deixa ótima impressão. É a peça que faltava para encaixar de vez a equipe de Coutinho. Sua passagem é amplamente vitoriosa (a despeito de seu temperamento complicado), marcando gols importantes, crescendo em jogos decisivos e ganhando a alcunha de “Artilheiro das Decisões” (seu ápice são os dois gols marcados na Decisão do Mundial, contra o Liverpool-ING). Duas passagens apagadas nos anos seguintes não desfazem o prestígio adquirido por Nunes, até hoje lembrado como um dos maiores centroavantes da história do Flamengo.
Jogos 152, Gols 79, Média 0,52 (Números da primeira passagem, 1980-1982)
2 – BALTAZAR, Flamengo 2-0 Santos, Campeonato Brasileiro 1983
O decepcionante final da Temporada de 1982 faz a Diretoria eleger seus “bodes expiatórios”. Um deles é Nunes, que após retornar de uma lesão no joelho não conseguiu exibir o seu costumeiro futebol, sendo substituído com frequência, ou mesmo barrado por Carpegiani. Em atrito com o treinador, Nunes o ofende em entrevista e é punido, sendo afastado do elenco. Assim, o Flamengo articula com o Grêmio uma troca por empréstimo, vindo o atacante Baltasar para a Gávea por um ano (indo o meia Tita para o Sul). A transação não é digerida pela torcida, que ainda nutre carinho por Nunes. Mas Baltazar, jogador com passagem por Seleção Brasileira e goleador pelo Grêmio (marcou o gol do Título Brasileiro dos gaúchos, em 1981), parece não sentir. Na estreia, contra o Santos no Maracanã, mostra estrela, ao contar com a colaboração do goleiro Ademir Maria, que aceita um frango clamoroso em um chute fraco. O gol “solta” Baltazar, que exibe bom desempenho nas partidas seguintes (chega a assinalar três gols num 3-2 contra o Paysandu e marca um golaço em pleno Olímpico, justamente contra o Grêmio, na estreia pela Libertadores). No entanto, o estilo mais “parado” de Baltazar não encaixa tão bem à equipe. O atacante também demonstra muitas vezes nervosismo e afobação, perdendo várias oportunidades. Com a chegada de Carlos Alberto Torres, Baltazar perde espaço, e no segundo semestre afunda com a crise decorrente da venda de Zico. Antes do final do empréstimo, é repassado ao Palmeiras.
Jogos 47, Gols 23, Média 0,49
3 – KITA, Flamengo 2-3 Corinthians, Campeonato Brasileiro 1986
Precisando fazer caixa, o Flamengo vende o esforçado centroavante Chiquinho ao Benfica-POR. O rubro-negro, no Estadual, resolve apostar no talentoso jovem Vinícius, jogador de boa técnica, mas algo lento. Vinícius alterna exibições razoáveis com atuações apagadas, e logo a Diretoria enxerga na posição uma lacuna para o Brasileiro. Assim, o Flamengo investe em Kita, artilheiro e Campeão Paulista pela surpreendente Internacional de Limeira. Kita, jogador grandalhão e trombador, dá seu recado logo na estreia, no Maracanã contra o Corinthians. Sob forte temporal, marca dois gols e, embora não evite a derrota da equipe (o adversário estreava outro atacante, Edmar, ex-Flamengo), Kita deixa ótima impressão. O jogador vai marcando gols nas partidas seguintes, mas começa a encontrar problemas quando Bebeto, recuperado de lesão, retorna ao time. Lazaroni jamais consegue fazer a dupla funcionar e, com o emprego ameaçado, acaba barrando Kita. O atacante ainda permanece para a temporada seguinte, recebe oportunidades esporádicas e participa da campanha do Tetracampeonato Brasileiro (marca dois gols importantíssimos nos 3-1 sobre o Coritiba, vitória que salva o cargo de Carlinhos). Ao final de 1987, é negociado de volta com a Internacional-SP.
Jogos 63, Gols 21, Média 0,33
4 – GAÚCHO, Flamengo 3-1 Cabofriense, Campeonato Estadual RJ 1990
O opaco desempenho de Bujica nos primeiros jogos do Estadual faz com que a Diretoria do Flamengo veja com bons olhos a vinda de um atacante mais tarimbado. E a oportunidade se dá quando o Palmeiras demonstra a disposição de negociar Gaúcho, centravante goleador mas de controverso comportamento extracampo (o que o vale atritos com as irascíveis e perigosas Torcidas Organizadas do alviverde paulista). Assim, Gaúcho chega por empréstimo ao rubro-negro até o final do ano. Sem muito tempo para treinar, é logo escalado para uma partida contra a Cabofriense, na Gávea. Marca um gol de cabeça e agrada, especialmente pela personalidade. Ao final da partida, declara não estar contente com o desempenho. “Se eu estivesse em forma, teria feito três”. Gaúcho rapidamente se adapta ao clube, e exibindo impressionante regularidade, toma conta da posição. Segue marcando gols até o final do ano, o que faz com que o Flamengo o adquira em definitivo em janeiro. Não sente a falta do amigo Renato Gaúcho, e segue comandando com êxito o ataque. Pouco habilidoso mas capaz de puxar contragolpes e exibindo notável faro de gol (suas potentes cabeçadas são mortais), vira ídolo da torcida. No entanto, após o Penta Brasileiro de 1992, o nível de suas atuações cai assustadoramente, o que é associado a um suposto pouco empenho nos treinamentos (Gaúcho também perde mobilidade após uma lesão no joelho). No ano seguinte, não digere bem a contratação de um concorrente (Nilson) e ao final do semestre é negociado com o Lecce-ITA. Até hoje, no entanto, é lembrado como um dos mais efetivos atacantes da história recente do Flamengo.
Jogos 199, Gols 98, Média 0,49
5 – NÍLSON, Flamengo 2-0 Cruzeiro, Amistoso 1993
Jogador rodado, com passagens por Internacional, Grêmio e Corinthians, é contratado para “fazer sombra” a Gaúcho, avaliado como “acomodado” pela Diretoria. Nilson, na verdade, estreia em um torneio amistoso na Argentina, em que enfrenta Huracán e Vélez Sarsfield em dois jogos de 45 minutos cada. E já impressiona ao marcar três gols nesses “minijogos”. Mas a estreia de fato se dá no Maracanã, em amistoso contra o Cruzeiro, partida que marca a volta de Renato Gaúcho ao rubro-negro. Sem a menor cerimônia, Nilson “rouba a cena”, anotando os dois gols da vitória flamenga por 2-0. O exuberante desempenho inicial faz com que Nilson barre o antigo titular, mas os maus resultados da equipe, e a consequente demissão de Carlinhos, mudam o panorama. Jair Pereira, o novo treinador, prefere o estilo de jogo de Gaúcho, reconduzindo-o à equipe após alguns jogos. Isso desmotiva Nilson, que perde rendimento. Com dois atacantes inseguros por conta da briga, o Flamengo passa a enfrentar problemas na função. Nilson é tido como bom finalizador, mas frio e “sem sangue”, o que dificulta sua aceitação pela torcida. Uma briga com o “intocável” Renato Gaúcho numa partida contra o Itaperuna não ajuda sua situação. Ao final do semestre, o Flamengo, já apresentando dificuldades financeiras, não consegue estender o empréstimo ou contratá-lo em definitivo. E Nilson é transferido para o Fluminense.
Jogos 35, Gols 25, Média 0,71
6 – CHARLES BAIANO, Flamengo 1-1 Madureira, Campeonato Estadual 1994
Contratado por empréstimo de 12 meses, Charles é a nova aposta da Diretoria, que busca colocar fim à elevada rotatividade na posição. Jogador de faro goleador, com passagem pela Seleção Brasileira e com um futebol que seduziu a Diego Maradona (que o colocou no Boca Juniors-ARG), Charles chega ao Flamengo tentando se recuperar da temporada anterior, marcada por lesões. O jogador já deixa sua marca na estreia, em um lance de oportunismo no empate contra o Madureira pela Taça Guanabara. Charles rapidamente se torna a principal referência do ataque flamengo, mostrando bom entrosamento com o jovem Sávio. Seu melhor momento se dá nas Finais do Estadual, quando marca os dois gols da espetacular virada (2-1) sobre o Vasco, vitória que coloca o rubro-negro como o principal candidato ao título. Mas Charles perde um pênalti decisivo na derrota para o Fluminense que, na prática, se mostrará vital para a perda da competição, o que intensifica certa hostilidade da torcida com o jogador (tido como pouco vibrante). Nos amistosos de preparação para o Brasileiro, sofre gravíssima lesão no tornozelo e perde o restante da temporada. Em dezembro, é devolvido ao Boca Juniors.
Jogos 30, Gols 18, Média 0,60
7 – RAMIREZ, Flamengo 2-0 São Caetano, Campeonato Brasileiro 2005
Desesperada com a real perspectiva de rebaixamento, a Diretoria rubro-negra traz um pacote de reforços na tentativa de reverter um quadro que se começa a se apresentar iminente. Um dos reforços é o atacante paraguaio César Ramirez, “El Tigre”, jogador experiente com passagem pela Seleção Paraguaia. Marrento, quase arrogante, Ramírez não sente o peso da árdua missão de comandar o ataque de uma equipe de futebol indigente. Na estreia, é o nome do jogo, marcando um belo gol e sofrendo um pênalti na vitória por 2-0 sobre o São Caetano, na Ilha do Governador, e sai de campo ovacionado. Ramirez depois se lesiona, mas volta a tempo de marcar gols importantes na luta contra o rebaixamento, enfim evitado após recuperação milagrosa. O bom desempenho faz com que “El Tigre” tenha o contrato renovado, mas seu início de ano é turbulento, marcado por uma séria enfermidade (contrai dengue hemorrágica) e por brigas com o treinador da Seleção Paraguaia. Um mal-explicado incidente com um cheque sem fundos emitido pelo Flamengo em seu nome o desgasta de vez com torcida e Diretoria, e é o estopim para o fim de sua passagem pelo rubro-negro, que o negocia de volta com o Cerro Porteño-PAR.
Jogos 32, Gols 11, Média 0,34
8 – SOUZA, Flamengo 1-0 Boavista, Campeonato Estadual RJ 2007
Animada com a excepcional fase de Obina, a Diretoria já analisa propostas para negociar o jogador, o que aliviaria as combalidas finanças do clube. Há quem dê como certa uma saída do baiano para o futebol russo. Assim, o Flamengo se antecipa e já traz o nome de reposição, o atacante Souza “Caveirão”, ex-Vasco, artilheiro do Brasileiro pelo Goiás. Souza, jogador alto e algo desengonçado, destaca-se pelo jogo físico e pelo razoável desempenho em finalizações, especialmente pelo alto. Atributos que não necessariamente suscitam grande empolgação por parte da torcida. E Souza já conhece a pressão logo em sua estreia, contra o Boavista, numa escaldante tarde de domingo no Maracanã. O jogador, após perder duas chances claras de gol, começa a ser vaiado e a conviver com os gritos de “Obina”, mas quando a partida vai se encaminhando para um enervante empate, consegue marcar, de cabeça, o gol da vitória flamenga. Irreverente, a torcida rebenta o grito “Ih, f…, o Souza apareceu”, que se tornará marca de sua passagem pela Gávea. Souza marca gols importantes e assume a posição (Obina se lesiona e não é mais negociado, mas perde espaço), termina 2007 como o artilheiro do clube, mas nunca deixa de ser visto com desconfiança pela Nação (que o “agracia” com apelidos de cone, poste etc). Em 2008, após bom início no Brasileiro, é negociado com o Panathinaikos-GRE.
Jogos 74, Gols 24, Média 0,32
9 – ADRIANO, Flamengo 2-1 Atlético-PR, Campeonato Brasileiro 2009
“Eu só quero é ser feliz, viver tranquilamente na favela onde eu nasci”. Desanimado, desmotivado e com saudade de casa, o atacante Adriano Imperador, um dos principais jogadores brasileiros em atividade, consegue rescindir seu contrato com a Internazionale-ITA. Pouco depois, seduz-se com a ideia de voltar a atuar pelo Flamengo, seu clube de coração, e apagar a má impressão deixada quando ainda era jovem. Agora consagrado, Adriano retorna ao rubro-negro e, após enorme expectativa, enfim estreia em um Maracanã lotado, que o homenageia e canta de alegria. O resultado é uma atuação de alto nível, em que Adriano, mesmo visivelmente fora de forma, impõe-se com notável facilidade aos seus marcadores. Anota um gol de cabeça e participa indiretamente de mais um gol da vitória por 2-1 contra o Atlético-PR. Adriano se torna o líder natural e a referência técnica de uma equipe que passa a acreditar na possibilidade de ganhar o Brasileiro. E, a despeito dos inseparáveis problemas extracampo, o Imperador é peça fundamental na conquista do Hexacampeonato. No ano seguinte, farto da cobertura ostensiva de suas peripécias fora dos gramados, cogita deixar o país. Nem mesmo a boa relação com seu novo companheiro, Vagner Love (com quem protagoniza o “Império do Amor”) reanima Adriano. O Imperador perde um pênalti decisivo contra o Botafogo. Deixa de atuar em algumas partidas pela Libertadores. Pragueja contra as “pessoas ruins”. E volta ao futebol italiano, para uma breve e apagada passagem pela Roma.
Jogos 48, Gols 34, Média 0,71 (números da segunda passagem, 2009-2010)
10 – HERNANE, Flamengo 3-1 Coritiba, Campeonato Brasileiro 2012
Contratado junto ao Mogi-Mirim (onde foi o vice-artilheiro do Campeonato Paulista) para compor o elenco, tendo em vista a perspectiva de negociação de Diego Maurício e as chegadas dos mais experientes Vágner Love e Liedson. Mas Hernane logo na estreia apresenta seu faro goleador ao, num bate-rebate, mostrar oportunismo e marcar o terceiro gol nos 3-1 sobre o Coritiba no Engenhão, pelo início do Brasileiro. No entanto, Hernane somente recebe oportunidades concretas no início do ano seguinte, após a saída da dupla de ataque titular. O “Brocador” apresenta bom desempenho, mas os maus resultados do Flamengo no semestre estimulam a contratação de Marcelo Moreno, jogador mais tarimbado. Mas, após bom início, Moreno sente o peso da camisa e acaba perdendo a posição para Hernane, que começa a exibir desconcertante capacidade de marcar gols, a despeito de sua pouca técnica, como um “centroavante à antiga”. Hernane termina por se tornar um dos destaques da temporada, culminada com um gol na Final da Copa do Brasil, nos 2-0 contra o Atlético-PR. No entanto, no ano seguinte Hernane se desmotiva com a chegada de Alecsandro e, após um início instável, é negociado com o Al-Nassr-ARA, numa transação que até hoje gera controvérsias.
Jogos 87, Gols 45, Média 0,52
* Fonte de Dados Numéricos: www.flaestatistica.com
Imagem destacadas no post e redes sociais: Divulgação / Flamengo.
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