A mãe de Christian Esmério, única que não fechou acordo com o Flamengo pela tragédia do Ninho, explicou no documentário da Netflix sobre a trágedia, lançado nesta quinta (14), porque se recusou a aceitar a oferta do clube.
“Cada um resolve da forma que é viável. Para mim fechar um acordo com o Flamengo não vai virar a página. Desde 2019 o que eu percebo é que o Flamengo está o tempo todo tentando responsabilizar terceiros por uma responsabilidade que é deles. Não é questão financeira, não é por questão de indenização. É questão de querer justiça. Eu não aceito que um réu sente na cadeira da Justiça e decida ele mesmo o que ele vai pagar. Porque no momento que eu aceito o que eles querem me dar, é estar dando a oportunidade de ele decidir qual é a pena deles”, justificou Andréa Esmério.
➕ Manobra jurídica atrasa pagamento a família de garoto do Ninho
Andreá e o ex-marido Cristiano, pai de Cristian, juntamente com o irmão do garoto do Ninho, ganharam em primeira instância da Justiça uma indenização de cerca de R$ 3 milhões do Flamengo. O clube pediu esclarecimentos sobre a decisão e deve recorrer para não pagar.
No documentário, Cristiano reclama da maneira como o vice-presidente jurídico do Flamengo, Rodrigo Dunshee de Abranches, se portou na audiência de conciliação realizada ainda em 2019 para tentar chegar a um acordo com a família das vítimas.
“Quando a gente entra pra reunião, o vice jurídico deles vira: ‘Daqui a 15 minutos eu tenho que dar uma saída, porque eu tenho outra reunião”. Pô, aquilo ali acabou com a gente. Foi uma coisa desumana total. Até me exaltei, dei um tapa na mesa na hora, que eu fiquei muito chateado com a situação. Estava com raiva, estava revoltado, tinha acabado de perder meu filho, e passar por um papel daqueles que o Flamengo estava me fazendo passar. Com tudo que nós passamos, com tudo que aconteceu, a perda dos nossos filhos, a falta de informação no dia do acidente, [a reunião] é onde nós acordamos para a vida e vimos que o Flamengo estava pouco se lixando”, afirma.
O documentário mostra uma cena de Andréa e Cristiano se reunindo com um advogado, que garante que o Flamengo é responsável pelo incêndio e a vitória na Justiça é certa, sendo apenas uma questão de definir o valor da indenização. O pai de Christian lembra que seu filho tinha passagem por seleções de base e contesta um argumento que o Flamengo acabaria usando no processo para tentar reduzir o valor da indenização.
“Porque meu filho não era promessa, meu filho não era mais que como ele foi na televisão falar não chegaria ao profissional”, diz.
Violência levou Christian a morar no Ninho; mãe era contra
Na primeira parte do documentário, os pais de Christian contam a história do Garoto do Ninho. Rubro-negro desde criança, o goleiro sempre teve o sonho de jogar no Flamengo, tanto que nem quis ir fazer teste no Fluminense.
“O Christian, o futebol fez ele perder muitas etapas da vida dele, de festa, de estar com os amigos. O Christian sempre foi flamenguista. Sempre, sempre. Ele já tinha sido visto por dois olheiros, que era do Flamengo e do Fluminense. Ele não quis nem ir fazer do Fluminense. E quando ele foi, e ele passou, acho que foi um dos momentos mais felizes da vida dele”, conta Andréa.
Como a família morava no Rio, a mãe resistiu a deixar o menino ir morar no Ninho do Urubu.
“Eu fui a única contra ele morar no Ninho, e por um bom tempo eu fiquei analisando se o correto era eu não deixar ele ir mesmo”, afirma.
Entretanto, como explica o pai de Cristian, a violência na comunidade onde eles moravam acabou fazendo os pais decidirem por deixar o filho ir morar no centro de treinamento.
“A gente estava tendo um problema, que na época aqui estava em guerra. As comunidades daqui estavam em guerra. E algumas vezes ele foi abordado pela polícia, pela altura dele. E aí isso alimentou mais de a gente deixar ele lá no Ninho”, explica Cristiano.
Christian contou sobre fogo no ar-condicionado na véspera de tragédia no Ninho
O pai de Christian diz que o filho nunca se queixou das condições de alojamento no Ninho:
“Ele sempre contou coisas positivas. Até onde ele dormia, ele nunca chegou e disse que era um lugar ruim de dormir. Porque era um sonho, ele queria estar ali. Então acho que se ele estivesse dormindo no chão ali dentro do Ninho para ele ia estar superbem.”
Entretanto, Cristiano lembra que, na véspera da sua morte, Christian relatou sobre o problema que a tempestade no Rio de Janeiro havia causado num ar-condicionado no Ninho – o curto-circuito em outro aparelho acabaria provocando a tragédia.
“Aí o Christian me ligou e falou: “Pô, pai, bem pegou fogo no ar-condicionado aqui do quarto. Mas tá tudo bem, o técnico veio aqui, mexeu e tal”, afirmou.
O responsável pela manutenção dos aparelhos de ar-condicionado no Ninho, Edson Colman, é um dos réus no processo criminal sobre o incêndio do Ninho, que segue sem conclusão.
O documentário “O Ninho: Futebol e Tragédia” está disponível desde a manhã desta quinta na Netflix.
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