Seis partidas oficiais do Flamengo com seus titulares e nada de gol sofrido. Apenas sete chutes tiveram a direção da meta defendida por Rossi, melhor média do Brasil entre equipes que disputarão a Série A em 2024.
A amostragem é baixa para decretar algo, pois a temporada mal começou. Porém, ao olhar para o campo e assistir o segundo gol de Pedro contra o Bangu, ou o anotado por Gabigol diante do Sampaio Correa, se torna flagrante a intenção de Tite em ver sua equipe recuperando bolas no campo de ataque adversário.
➕ Em franca evolução, Flamengo mantém o que estava bom e apresenta novidades
A agressividade do Flamengo ao marcar as saídas de bola adversárias é, até aqui, a maior desde que estes dados são coletados. Sim, o time de Tite (até aqui) permite menos passes aos seus adversários durante sua saída de bola do que o então liderado por Jorge Jesus.
Na análise de dados, há um número que simboliza essa agressividade. Trata-se do PPDA (Passes por Posse de Bola do Adversário). Essa estatística mede o número de passes trocados pelo adversário da equipe analisada, em seus 60% iniciais do gramado. Basicamente um dado que contabiliza o número de passes que um adversário troca durante a fase inicial de sua construção.
Na figura 1 você encontra um comparativo dos últimos anos do Flamengo, desde o início desta temporada de sucesso do clube. Quanto mais baixo o número médio, menos passes na média seus adversários trocam, logo melhor será o desempenho da equipe.
Figura 1 – PPDA de 2024 é disparadamente o melhor desde 2019. Fonte: Wyscout]
Note que é o melhor número da equipe, o que certamente é explicado pela capacidade física do elenco neste momento da temporada, além da preparação e priorização tática de movimentos que evitam passes adversários.
Destacados em amarelo, os dados das três temporadas vencedoras do Flamengo. O pior dado é disparadamente o de 2023, o que pode depor contra as famigeradas férias prolongadas do elenco, e as insuportáveis trocas de treinador e preparadores físicos.
É verdade que a amostragem ainda é bastante curta e ainda não trazem dados conclusivos sobre a qualidade, mas já trazem conclusões sobre as intenções de Tite para o Fla. No entanto, a intenção deste trabalho, não é apenas alertar para o curioso dado acima. Há um segredo impopular que torna aquilo possível!
Estou falando das faltas táticas! Sim, o Flamengo se expõe ao subir seu bloco de marcação em um modelo mais zonal do que individual, mas caso aquele primeiro bloco seja quebrado, os comandados de Tite não pensam duas vezes antes de parar as jogadas. A figura 2 demonstra isso claramente, ao apresentar o mapa de faltas realizadas pelo Fla. Aliás o Flamengo tem feito mais faltas do que seus adversários quando consideramos o tempo que cada equipe fica com a bola.
Figura 2 – Mapa de faltas aponta jogadores de frente como os mais faltosos diante do Bangu, indicando a esmagadora maioria das infrações no campo de ataque. Fonte: Wyscout
As faltas táticas são um recurso utilizado por alguns times no futebol brasileiro e mundial. Por incrível que possa parecer, geralmente as equipes mais plásticas e com maior número de atacantes em campo, são as maiores adeptas de tal recurso. Um exemplo? Pep Guardiola!
O grande Barcelona de Guardiola, tido por muitos como uma das melhores equipes da história do futebol, bebia bastante dessa fonte, como destacado em ótima matéria escrita por Luke Hussey em 2012, chamada “Barça – The dark arts”.
Na matéria, Hussey calcula a densidade de faltas (faltas cometidas por minuto da posse de bola do adversário) daquele time durante a campanha pelo título da Champions League e demonstra que o time espanhol cometeu mais faltas proporcionalmente do que quase todos os adversários que enfrentou. A figura 3 foi extraída daquela matéria.
Figura 3 – Densidade de faltas do Barcelona campeão da Champions com Guardiola
De lá para cá, a prática tornou-se cada vez mais estrutural em equipes que zelam pelo bom futebol e grande número de jogadores ofensivos em campo. No Brasil, o Fluminense de Fernando Diniz é o principal exemplo disso nos últimos anos.
Ao comparar a equipe atual do Flamengo com a dos últimos anos (figura 4), repetindo o exercício realizado no início deste texto, é possível notar que não se trata de algo inédito no Rubro-Negro.
O time liderado por Rogério Ceni, que terminou a temporada de 2020 com o título brasileiro, é o único com densidade de faltas ligeiramente superior ao time de Tite. O que é uma conclusão natural, quando recordamos que aquela equipe era tão ofensiva que contava com Diego Ribas de primeiro volante e William Arão como zagueiro!
Figura 4 – A barra amarela apresenta a posse de bola percentual de cada ano no Flamengo, enquanto os pontos que formam a linha branca determinam a densidade de faltas. Note como a única equipe que tem números semelhantes à de Tite foi a treinada por Ceni.
Sempre importante, é repetir que a amostragem baixa ainda permitirá bastante variância estatística destes dados, que poderão mudar ao longo do tempo. Porém, a intenção de Tite fica clara.
O treinador rubro-negro quer uma equipe intensa sem a bola, sem deixar o adversário respirar e mantendo a bola distante de sua baliza. Para isso, tem se notabilizado na combatividade. A marcação de faltas está prevista na regra do jogo, assim como existe punições com aplicação de cartões mesmo quando não há violência.
Apesar de saber a hora de recorrer às faltas, elas não são o objetivo principal. Afinal, o Flamengo é entre as equipes que disputarão a Série A do Brasileirão, a que mais realiza duelos defensivos. Também é a primeira em percentual de duelos ganhos.
No entanto, quando não é possível recuperar, a equipe não se envergonha em parar a jogada. Não gosta deste estilo?
Bom… este é o tal “futebol moderno”, que tornou o jogo em mais físico do que nunca, e os espaços mais raros.
Marcar alto e ser pouco vazado mesmo com uma equipe lotada de atletas ofensivos, requer cuidado. Requer também uma dose de pragmatismo, pois ter muitos atacantes ao mesmo tempo não é uma utopia. Mas para tal, é preciso “jogar o jogo”.
Sobretudo é preciso aceitar o jogo como ele é.
Victor Nicolau, o “Falso Nove”, é Analista de Desempenho certificado e formado pela CBF e outras instituições de ensino internacionais. Engenheiro Civil de formação, atua como executivo de compras há 10 anos. Siga Falso Nove no Twitter e inscreva-se em seu canal no YouTube.
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