Nascido em 1980, minhas lembranças pré-2019 na Libertadores eram de decepções e tristezas. Afinal, até cinco anos atrás, éramos apenas um gigante nacional, com uma torcida de milhões e uma tradição e história escassa na América.
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Colecionávamos, na verdade, vexames e derrotas fragorosas, e muitas delas têm nome e sobrenome quando personifico os revezes: Matheus Sávio, Cabãnas, Léo Moura (acompanhando a eliminação no radinho), Montillo, Vinícius Pacheco, Ney Franco, Thiago Neves (no Cruzeiro)… coloco fora da ordem cronológica para minimizar a dor da nostalgia.
➕ Gabigol dá até ‘caneta’ em Arrascaeta em treino do Flamengo; veja
De fato, a geração de jogadores comandada por Jorge Jesus trouxe o Flamengo a um outro patamar continental. Com um esqueleto de equipe razoavelmente preservado, e por pior treinado (e dirigido fora das quatro linhas) que ainda fosse nas outras duas edições, fomos duas vezes campeões e uma vez vice, em 2019, 2021 e 2022.
No balanço, são cinco anos de mais glórias e memórias positivas, que colocam o clube no panteão continental que merece. Apesar do fracasso retumbante em 2023, quando vimos mais um rival carioca chegar à Glória Eterna, e de um 2024 com resultados muito aquém do que já vislumbramos, ainda associamos personagens aos sucessos do último quinquênio assim como fazíamos com os vilões de outrora.
E quatro deles estarão em campo amanhã.
Gérson, com suas passadas largas na volância, ditava o equilíbrio para o quarteto mágico em 2019. Hoje é o nosso capitão, referência e líder.
Arrascaeta… ah! Quem não lembra o carrinho em Lima ou o golaço contra o Corinthians no Itaquerão, nas mesmas quartas-de-final há dois anos? Se hoje não tem o fôlego ou o físico de seus late-20s, ainda segue como nossa referência técnica.
BH: pelos lados, pelo alto e avante, o nosso ponta velocista fulminou o Internacional – também nas quartas, mas há 5 anos, com dois gols na ida e uma assistência à la Romário em 1994 (o Gabigol tá pedindo!). Ele deu a assistência primorosa para a virada no Peru e fez história contra o Barcelona ao marcar quatro gols nas duas semifinais, no Rio e em Guayaquil. Dificilmente alguém foi mais decisivo do que ele nesta etapa da competição em toda a sua história.
E ele. Sim, ele. Gabriel Barbosa, Gabi, Gabigol. O Predestinado, o Traíra, o ex-jogador. Daquele gol tímido em Oruro, que abriu o caminho para o nosso bicampeonato, até o gol contra o Ñublense, no ano passado, foram 31 gols e o recorde brasileiro na artilharia do torneio. Entre um e outro, quatro gols em três finais.
Não há o que discutir: seja qual for a sua “tribo”, o nosso noventa e nove é o ás do Flamengo na Libertadores. A confiança por uma boa atuação do LilGabi recai muito mais na mística? É verdade. Mas ele estará lá. E esperemos que esteja no melhor de seus últimos dois anos, e que seja o começo de um fim digno de um ícone do CRF.
O momento é muito adverso. Eleições à porta, crise médica, técnica, física e tática. Desfalques em profusão, comissão técnica contestadíssima e desrumada. Diretoria de pouco respaldo e pulso. A sombra de um segundo ano repleto só de fracassos está à porta. Necessidade de vencer o adversário fora de casa, e talvez uma decisão por pênaltis se formos felizes.
Mas não há outro remédio. Será torcer e torcer. Esquecer o passado distante e o presente de agora.
Quando olharmos os nossos grandes astros da história daqui a alguns anos, os quatro valetes, mesmo chumbados, mesmo machucados, estarão na eternidade. Eles têm a chance de seguir escrevendo mais um capítulo de glória e nos fazer dar uma respirada ante a visão do futuro próximo. Estarei contigo, meu Flamengo.
Paulo Caruso de Lima é jornalista, trabalhou no Diário LANCE! e é funcionário da ONU em Bruxelas. Reside desde 2008 fora do Brasil e é militante das causa flamengas no exterior. Fundou o Consulado FlaBruxelas em 2019.
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