Passados mais de 365 dias, Jesus tem mais títulos que derrotas, sepultou críticos e inaugurou uma nova era no futebol nacional
Blog Ninho do Urubu | Bruno Guedes – Twitter: @eubrguedes
No dia 10 de julho de 2019 Jorge Jesus iniciava sua história no Flamengo e mudava a do clube. A partida foi contra o Athletico e em meio às desconfianças da imprensa — para usar um termo mínimo, haja vista que até ataques beirando a xenofobia aconteceram — e o corporativismo dos técnicos brasileiros. Passados mais de 365 dias, o português tem mais títulos que derrotas à frente da equipe, todos os seus críticos sepultados e inaugurou uma nova era no futebol nacional.
Era junho de 2019. Após quase acertar com outros times e uma digressão de um mês pelo país, o técnico português era convencido pela diretoria Rubro-Negra a aceitar o projeto. Pegava um trabalho desastroso após apostarem em um estilo ultrapassado. Sob os ataques da arrogância tupiniquim, que não aceita que outros não só joguem um futebol muito superior ao daqui, Jesus desembarcou trazendo na mala a esperança de uma torcida que queria se livrar do estigma do “cheirinho”.
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Na imprensa, uma chuva de aberrações que fugiam totalmente o profissionalismo. Os que se preocupam apenas em polemizar e brigar, mesmo que de forma encenada para ter audiência, chegavam ao cúmulo de dizer que “Portugal nunca foi campeão de nada”. Já na ala dos “professores”, diziam que “ele estava roubando o espaço”. Espaço este que foram incapazes de sustentar por incompetência.
Já no seu primeiro jogo, contra o Athlético pelas quartas de final da Copa do Brasil, o português mostrou que não estava ali para ser mais um estrangeiro. Mas sim mudar tudo de arcaico que estava consolidado no país. Porém, na eliminação deste torneio, um tsunami de críticas para o trabalho que não completara ainda um mês e jogadores assimilando a sua mentalidade europeia.
Entretanto, como o hino lusitano prega, “levantai hoje de novo”, Jorge se levantou. Todos, absolutamente todos os críticos, foram derrotados. Assim como os rivais do Flamengo. Jogo após jogo, a equipe se aproximava de um futebol só visto na TV através das transmissões de campeonatos internacionais. Os que sempre fecharam os olhos para a maneira jogada nos grandes centros se espantavam, tratavam até como novidade. Mas os que sempre sabiam que com Abel não iria lugar algum, porque o que se pratica aqui é outro esporte em relação à Europa, não.
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Ninguém conseguia acompanhar. Era pressão o tempo todo, fome pela posse da bola, vontade de fazer mais e mais gols, extrair o máximo de cada jogador e uma intensidade totalmente fora dos padrões brasileiros. A estratégia enraizada de fazer um gol e “fechar a casinha”, a essa altura do campeonato (literalmente), era vista como vergonha.
Gabigol saiu de “será que vai dar certo” para papel de ídolo. William Arão, depois de viralizar como meme no “tá mal, Arão” e perseguido pela torcida, virou o grande motor com partidas disputadas e xodó. A zaga, antes uma peneira, se tornou sólida e referência. Arrascaeta, que com Abel “não podia jogar com Bruno Henrique e Gabriel Barbosa”, não só virou titular, como um dos goleadores. Aliás, o trio, que para o técnico anterior era um problema se jogasse junto, terminou a temporada de 2019 com 96 gols ao todo. Superando mais da metade dos times da Série A em total de tentos marcados.
E enquanto Renato Gaúcho atacava com frases na fronteira da xenofobia, dizendo entre outras coisas que seu “time jogava o melhor futebol do Brasil”, apanhava de 5 a 0 no Maracanã, pela semifinal da Taça Libertadores, em uma noite histórica. Calado durante quase toda a temporada, Jesus preferiu falar e soltar seus demônios com os troféus embaixo do braço.
Virou referência. Melhor futebol do Brasil. Melhor futebol das Américas. E melhor até que o da própria Seleção Brasileira, que com sua chata, apática e pragmática maneira de jogar passou a ser cobrada para ter uma cara de Brasil. Rosto que um português deu e nenhum outro teve capacidade. E se o país aprendeu com o Mister, ele também com o Rio de Janeiro. Adaptou-se, virou até “zoeiro”, como o carioca gosta de dizer, nas provocações sobre o trio elétrico: “Cincum?”.
De quebra ainda salvou a diretoria Rubro-Negra, que começou o ano bancando o ultrapassado estilo “paizão”. Porém, numa total aposta certeira, mudou os rumos do clube. E foi assim que Jorge Jesus conquistou a torcida do Flamengo. Conquistou também o Brasileirão, a Libertadores, a Recopa Sul-Americana, a Recopa do Brasil e o Campeonato Carioca. Cinco títulos. Um a mais que o número de derrotas, que foram quatro.
Não se sabe se mais um ano virá. Mas JJ, como é carinhosamente chamado, suplantou os críticos e envergonhou os que ainda levantam a bandeira da arrogância de que só brasileiro domina o futebol.
Às armas, Jorge Jesus. Contra os canhões, marchar, marchar…
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