Gustavo Roman | Twitter @guroman
Com a conquista do Tricampeonato, a expectativa na torcida crescia. Afinal, o Flamengo que mandava no futebol carioca ainda não havia brilhado em termos nacionais. Zico, por exemplo, era chamado de jogador do Maracanã. Tentando mudar isso, Coutinho não requisitou a contratação de nenhum reforço. Para o treinador, o elenco já era suficientemente forte e precisava de qualidade e não quantidade.
O rubro-negro foi incluído no Grupo L do certame nacional, junto com Gama, XV de Piracicaba, Londrina, Grêmio, Bahia, Santa Cruz e Náutico. Apenas os dois primeiros colocados avançavam a próxima fase.
Os dirigentes da CBD marcaram a estréia para quinta feira, apenas quatro dias do Tri estadual. Revoltados, os cartolas do Flamengo ameaçaram não colocar o time em campo. Sem tempo para descansar ou recuperar os contundidos, Zico, Tita e Carpegianni foram vetados. A solução achada por Coutinho foi escalar Cláudio Adão como meia de ligação e Beijoca no comando do ataque.
Mesmo com todos os problemas, o mengo não teve dificuldades para vencer o XV de Piracicaba, por três a zero. Cláudio Adão, duas vezes e Almeida, contra foram os marcadores.
A segunda partida também aconteceu no Maracanã. Frente o Náutico, triunfo de dois a zero. Beijoca e Júnior anotaram os tentos. Após a partida, o Departamento Médico confirmou que Zico retornaria no jogo seguinte.
Com o galinho de volta, o estádio Bezerrão, em Brasília bateu seu recorde de renda e de público. Segundo laudo dos bombeiros cabiam 30.000 pessoas. Porém, mais de 40.000 estavam lá dentro, causando uma superlotação. Em campo, o Flamengo conquistou sua terceira vitória seguida. Zico e Adão marcaram, na vitória de dois a um.
O próximo compromisso seria decisivo para a classificação. Em casa, o fla receberia o Grêmio. Todos queriam vingança do 5×2 de 78. Para este confronto, Rondinelli estava vetado, contundido. Sem muitas opções, Coutinho confirmou a escalação do recém contratado Boca na zaga. Tita ficaria no banco, sem condições de atuar os 90 minutos.
Flamengo 2×0 Grêmio
Originalmente, Coutinho arrumou seu time com Adílio na ponta esquerda, Adão no comando do ataque e Reinaldo, na direita. No meio, Andrade era o volante mais marcador. Carpegianni tinha liberdade para encostar no ataque e Zico era o comandante da equipe.
O começo de partida não poderia ser melhor para o rubro-negro. Aos dois minutos, Carpegianni soltou uma bomba de longe e mandou a pelota no ângulo superior direito de Manga. Fla um a zero!
Na jogada seguinte, Baltazar ganhou a dividia de Boca e mandou m petardo de pé esquerdo. Cantarele teve que se esticar todo para mandar a finalização para escanteio.
Mesmo em desvantagem, o tricolor não se expunha muito, preferindo manter o seu estilo de muita marcação. Com o adversário plantado na defesa, o mengo tocava a bola, tinha a posse de bola, mas não ameaçava a meta de Manga. Somente aos 39, a equipe carioca marcou seu segundo gol. Júnior, deslocado pela meia esquerda, lançou Zico em profundidade, entre os zagueiros. O camisa 10 foi a linha de fundo e cruzou na medida para Cláudio Adão escorar e mandar para o fundo das redes. Dois a zero!
Nos minutos finais da primeira etapa Toninho sentiu uma contusão e teve que ser substituído por Leandro.
A primeira chance da etapa final gaúcha. Vantuir cabeceou sozinho e Carpegianni salvou em cima da linha, evitando o primeiro gol do Grêmio. Enquanto isso, o time da Gávea recuava e tentava explorar os contra ataques.
Boca se lesionou e teve que deixar o gramado, aos 25. Com isso, Cotinho teve que mexer em várias posições. Andrade passou a ser o lateral direito. Leandro passou a atuar como zagueiro. Adílio voltou para o meio de campo e Júlio César foi para a ponta esquerda.
Aos 39, Adílio tabelou com Cláudio Adão e acertou a trave direita de Manga. Este foi o último lance interessante que aconteceu no gramado. O Flamengo mantinha os 100% de aproveitamento e praticamente assegurava a sua classificação a próxima fase.
O desafio seguinte era contra o Londrina, fora de casa. A diretoria rubro-negra pediu a CBD que realizasse exame antidoping. A partida foi equilibrada e terminou empatada em um a um. Cláudio Adão fez o gol carioca. A equipe perdia seu primeiro ponto no certame. Nada que ameaçasse a liderança da chave.
Para sacramentar de vez a vaga, o Fla precisava de uma vitória nos dois jogos que faltavam. Em Recife, a delegação enfrentou um clima de guerra. Apesar da superioridade técnica, os comandados de Coutinho não saíram do zero contra o Santa Cruz. Com isso, a equipe iria precisar pelo menos do empate na rodada final.
Insatisfeito com o rendimento do time nos dois últimos empates, o treinador resolveu mexer no onze titular. Andrade jogaria improvisado na lateral direita. Adílio voltaria ao meio de campo e Carlos Henrique seria o ponta esquerda.
As alterações deram certo e o Flamengo goleou o Bahia, no Maracanã, por quatro a zero. Cláudio Adão foi o grande destaque da tarde, marcando três gols. Jorge Luís, contra completou o marcador. Com os dois pontos, a equipe garantiu a primeira colocação do grupo.
No dia seguinte, a CBD divulgou os grupos da Terceira fase. O Tricampeão Carioca ficou junto com São Bento, Comercial e Palmeiras. Três paulistas. Apenas o vencedor de cada chave avançaria as semifinais.
A divulgação da tabela agradou a todos na Gávea. O primeiro compromisso seria contra o São Bento, no Maracanã. Depois, a equipe iria a Ribeirão Preto, enfrentar o Comercial e fecharia sua participação novamente em casa, diante do Palmeiras.
Para o jogo diante do São Bento a ordem era atacar. Coutinho sabia da importância de fazer um bom saldo de gols, para poder jogar pelo empate na última rodada.
Flamengo 4×0 São Bento
Com a volta de Toninho, Andrade pode jogar na cabeça da área. Adílio e Zico completavam o meio de campo. Reinaldo, Cláudio Adão e Carlos Henrique formavam o ataque. O desfalque da vez era Carpegianni. Na zaga, sem Rondinelli, Nelson e Boca, quem jogou ao lado de Manguito foi Dequinha.
E o gol não demorou a sair. Aos 13, Júnior achou Adílio, que achou Zico sozinho dentro da área. O galinho bateu. O goleiro sorocabano espalmou e Cláudio Adão marcou na sobra. Um a zero.
A partir dali, o time parece que se desinteressou pelo jogo. A tal ponto do São Bento assustar, em uma cobrança de falta de Ticão, esplendidamente defendida por Cantarele. Aos 39, Brandão apareceu na cara do goleiro rubro-negro, que mais uma vez foi obrigado a se virar para evitar o empate. Dois minutos mais tarde, nova oportunidade do time visitante. Campos, de bate pronto, mandou perto da trave, assustando os torcedores presentes ao Maracanã. Sob vaias, o rubro-negro deixou o gramado rumo aos vestiários.
Tentando melhorar o desempenho da equipe, Coutinho começou a etapa final com Tita no lugar de Carlos Henrique. Mas foi Zico, sempre ele, quem tirou o time do sufoco. Aos 18, ele cobrou com perfeição uma falta e marcou o segundo gol do fla.
Aos 37, Zico recebeu ótimo passe de Reinaldo, mas perdeu o tempo da bola e chutou em cima de Márcio. A partida tornou-se extremamente violenta de parte a parte. E o árbitro, Manoel Amaro nada fez para coibi-la.
Para sorte de todos, aos 41 saiu o terceiro gol. Zico deixou Reinaldo em excelente posição, entre os zagueiros. O ponta direita dominou, driblou Márcio e tocou. Três a zero.
Ainda haveria tempo para o quarto tento carioca. Aos 44, Reinaldo cobrou forte uma falta. Márcio tentou encaixar e bateu roupa e Zico, de cabeça, aproveitou para fechar o placar. Na continuação, Toninho foi expulso ao agredir o jogador do São Bento. Placar final, Flamengo quatro a zero!
No Morumbi, o Palmeiras assumiu a liderança do grupo graças ao número de gols marcados, ao golear o Comercial, por cinco a um.
No meio de semana, o rubro-negro foi até Ribeirão Preto e conseguiu outra boa vitória, desta vez, pelo placar de dois a zero. Carlos Henrique e Zico marcaram os gols. Na mesma noite, o Palmeiras fez quatro a zero no São Bento, jogando em casa e garantiu a vantagem de jogar pelo empate no Maracanã.
O clima que antecedeu o confronto foi de puro otimismo. Na Gávea, todos acreditavam que venceriam o alviverde e que estariam pela primeira vez na história do clube em uma semifinal de Campeonato Brasileiro. Como o Inter já havia garantido a sua classificação na outra chave, os dirigentes rubro-negros já haviam reservado passagens e estadia em Porto Alegre, onde seria disputada a primeira partida da semi. Só esqueceram de avisar ao verdão!
Flamengo 1×4 Palmeiras
Para este duelo, Coutinho escalou um time mais ofensivo, já que necessitava da vitória. Toninho estava de volta a lateral direita. Dequinha e Manguito formavam a zaga. Júnior completava a defesa. No meio, Carpegianni, Adílio e Zico. Reinaldo, Cláudio Adão e Tita completavam a equipe. A jovem equipe paulista, treinada por Telê Santana tinha como destaques Jorge Mendonça, Pedrinho, Baroninho, Rosemiro e César.
A primeira oportunidade foi do Flamengo. Tita se livrou de dois e rolou para Carpegianni mandar uma bomba da entrada da área. Gilmar se esticou todo e conseguiu fazer uma excepcional defesa, desviando para escanteio.
O rubro-negro era melhor, mas quem abriu o placar foi o Palmeiras. César passou como quis por Manguito, invadiu a área e chutou cruzado. Jorge Mendonça apenas escorou para fazer um a zero.
Sem inspiração e esbarrando na ótima marcação imposta pelo clube paulista, o Flamengo criava muito pouco. Só aos 43, surgiu nova chance. Júnior centrou a bola. Adão a matou no peito, girou e chutou forte. Gilmar fez a defesa em dois tempos. Zico ficou louco, reclamando do centroavante, pois estava sozinho, a sua direita e teria melhores condições de empatar a peleja.
No ataque seguinte, um lance digno de inacreditável futebol clube. Jorginho puxou um contra ataque nas costas de Júnior. Foi até a linha de fundo e cruzou rasteiro. César, de dentro da pequena área, sem ninguém para atrapalhá-lo, nem mesmo o goleiro já que Cantarele havia tentado antecipar o cruzamento bateu de chapa, mas redonda explodiu no travessão. Incrível!
Sem ter alternativa, o mengo partiu com tudo para o ataque nos 45 minutos complementares. Em contrapartida, deu ao Palmeiras o espaço que ele queria para usar o contra ataque.
A blitz rubro-negra deu certo, pelo menos momentaneamente. Aos 8, Zico invadiu a grande área e foi calçado por Pires. Pênalti assinalado pelo árbitro Cai Rosa Martins. O próprio galinho foi para a cobrança e empatou a partida. A esperança voltava a tomar conta do estádio.
Aos 23, uma ducha de água fria na torcida. Baroninho cobrou uma falta da ponta direita, de forma direta, rasteira. Carlos Alberto se antecipou a Carpegianni e desviou para as redes. O curioso é ver no vídeo taipe que Cantarele chamara atenção de Carpegianni para a entrada de um jogador exatamente por onde saiu o gol.
Coutinho tentou mexer no time, sacando Reinaldo e fazendo entrar Carlos Henrique. De nada adiantou. A esta altura, o Flamengo já estava perdido em campo. Em seguida, aos 31, veio o golpe fatal. Pedrinho lançou Baroninho, nas costas de Toninho. O ponteiro segurou a bola e permitiu que o lateral chegasse para mandar uma bomba e marcar o terceiro. Três a um.
No desespero, Coutinho pôs em campo Beijoca, na vaga de Adílio. A única coisa que o atacante conseguiu foi fazer uma tremenda confusão. Primeiro, ele deu uma cotovelada em Mococa. Depois, um soco em Baroninho. Claro que foi acabou expulso pelo árbitro.
Mas ainda haveria tempo para mais um gol palestrino. Aos 44, o time carioca parou, pedindo a saída de bola pela linha lateral. Baroninho foi a linha de fundo e cruzou na cabeça de Zé Mario, que marcou o quarto gol e fechou o caixão. Palmeiras quatro a um!
Com a eliminação a estimativa do prejuízo para os cofres do Flamengo era de aproximadamente 15 milhões de cruzeiros.
No próximo texto: O pós Brasileiro, as férias e a pré temporada de 1980. Até breve!
Gustavo Roman é jornalista, historiador e escritor. Autor dos livros No campo e na moral – Flamengo campeão brasileiro de 1987, Sarriá 82 – O que faltou ao futebol-arte? e 150 Curiosidades das Copas do Mundo. Conhecido como um dos maiores colecionadores de gravações de jogos de futebol, publica toda quinta-feira, aqui no MRN, a série “Biografia Rubro Negra 1978-1992”, onde conta a saga do período mais vitorioso da história do clube mais querido do mundo.