Primeiro, como já virou tradição quando se comenta o Flamengo de 2022, é preciso retirar todos os álibis, justificativas e escudos retóricos do caminho. Então vamos lá.
Sim, é fato que o rubro-negro tem hoje mais jogadores lesionados que absolutamente qualquer outra equipe no Brasil, porque atuar no Flamengo tem uma periculosidade mais alta que ser motoqueiro de globo da morte em cidade pequena, adestrar jacaré ou desarmar mina terrestre.
Também é fato que, entre jogadores machucados, poupados e precisando de minutos em campo, o Flamengo tinha hoje um elenco absolutamente remendado, com atletas que possivelmente nunca haviam se cumprimentado até o treino de ontem e ainda se chamam por apelidos como “ei, grandão” e “você aí, ô careca” e portanto é impossível qualquer arremedo de entrosamento.
Do mesmo autor: Explicações existem muitas, mas justificativas é complicado de achar
Existe também a maratona de viagens, e a ausência de treinos e as carências do elenco. Você pode colocar aí a pressão sobre o técnico, a crise causada pelas declarações de Jorge Jesus, o clima na Gávea após as votações polêmicas da última semana. Você pode colocar até, sei lá, a preocupação do motorista do ônibus da delegação com o aumento dos combustíveis, Rodinei tendo pesadelos com a guerra na Ucrânia, Felipe Luís ainda indignado porque achava que “Ataque dos Cães” deveria ter ganho o Oscar de melhor filme.
Nada disso, absolutamente nada disso, justificaria a dificuldade que o Flamengo, o time de maior receita do continente e que planeja brigar pelo Brasileirão, Libertadores e Copa do Brasil, teve para se classificar, em dois jogos, sobre o Altos do Piauí, 18º colocado da Série C, uma equipe que tomou de 4×1 do Figueirense, que nem finalista do estadual de Santa Catarina foi, e perdeu de 3×1 do Volta Redonda, rebaixado no Campeonato Carioca.
Porque o Flamengo venceu as duas partidas, uma por 2×1 e outra por 2×0, mas em nenhuma delas mostrou o domínio que se espera de um time de primeira divisão contra um de terceira, o potencial ofensivo que se espera de uma equipe com alguns dos melhores meias e atacantes do brasil, ou a qualidade defensiva que você tem obrigação de demonstrar quando seus zagueiros ganham 600 mil reais e os atacantes adversários são Dico e Danilo Bala.
Então a equipe rubro-negra venceu, mas mais uma vez ficou imensamente distante de convencer. A defesa ofereceu espaços imensos que só não foram explorados em virtude da fraqueza técnica do adversário, o meio dependia da criatividade de um Diego Ribas que parece cada dia mais incapaz de armar jogadas, o ataque viveu momentos de desespero em que Gabigol vinha praticamente até a meta de Hugo para ter alguma chance de encostar na bola.
De notícias positivas, apenas o retorno de Rodrigo Caio, que muitos consideravam que, dado o tempo passado no DM, só voltaria a atuar pelo Flamengo na função de médico, mas atuou em alto nível durante todo o primeiro tempo até ser substituído; a partida tranquila do lateral-esquerdo Marcos Paulo, a surpresa da escalação; e claro, Victor Hugo, outra cria da base e autor do segundo gol numa bela cabeçada.
Mas no geral, o que vai ficar da partida de hoje, além dos protestos contra a diretoria, é mais uma atuação pobre de um Flamengo que pode seguir tendo todos os álibis do mundo, todas as explicações e justificativas possíveis e imagináveis, mas não pode se proteger da realidade de ser um time que joga mal, não empolga a torcida e não parece dar muitos sinais de evolução. Vamos ver até onde dá pra chegar assim.
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