Após ser eliminado por um time da série A, o Flamengo dobrou a meta e foi eliminado por um time da série B, então ousou e triplicou a meta sendo eliminado por um time de série C conquistando uma rara Tríplice Coroa da Vergonha. A repetição do placar de ida foi pouco diante do vexame que foi o jogo contra o Fortaleza.
Novamente vimos a escalação do 4-4-2 derivado do 4-3-3 com Paulo Victor –Rodinei, Léo Duarte, Juan, Jorge – Arão, Cuéllar, Mancuello, Éverton – Sheik e Ederson. Diante do veto a Guerrero pelo departamento médico, o óbvio seria ver Vizeu assumindo a posição como em outros jogos, mas Jayme insistiu na invencionice de Muricy colocando Ederson, transformando um recurso pontual de fim de jogo em uma proposta de jogo com tudo pra dar errado.
Tática é muito mais que números
Tática não é uma sopa de números como gostam de dizer, tão pouco tem relação com posições pré-definidas de jogadores. Não podemos vê-los como especialistas exclusivos e sim avaliar sua posição de acordo com sua função em campo. Em um exemplo extremo, se Muralha entrar no lugar de Guerrero, não será goleiro e sim atacante, da mesma forma se Mancuello atua aberto na esquerda não é meia e sim um ponta, pois esta é sua função.
Ou seja, para escalar um time numa determinada formação tática é necessário saber como ela funciona e que características um jogador tem que ter para atuar em cada posição dentro do esquema. Se Muricy ou Jayme soubessem o mínimo sobre isso não teríamos visto Ederson escalado como centroavante, enfiado na área quase que o jogo todo.
As principais características de Ederson são sua mobilidade, capacidade de drible, visão de jogo, passe e finalização. Ele é mais definidor do que armador e por isso seu melhor desempenho em futebol foi jogando aberto como ponta ou meia esquerdo, chegando ao fundo para cruzar ou entrando em diagonal para definir. Mas ontem Ederson ficou enfiado na área, não era sequer o falso 9 que atuou contra o Sport no fim do jogo, saindo da área para buscar jogo e deslocando a marcação para Cirino entrar livre.
O resultado desse experimento bizarro foi vermos um Ederson subutilizado, enquanto Sheik se movia por espaços errados em novo jogo ruim. E diante da nulidade que era o ataque, o mínimo que se esperava era a saída de Sheik e entrada de Vizeu, deixando Ederson livre para se movimentar como 2° atacante ainda no primeiro tempo, mas isso não aconteceu em nenhum momento.
Ataque inoperante
Éverton é rápido e forte, mas tem um passe ruim, não é armador, sequer o vejo como opção para ser titular. Ontem mais uma vez correu, tentou aparecer na área provocando alguns impedimentos, errou passes no ataque e de concreto fez muito pouco.
Sheik se movimentou bastante, mas geralmente por espaços errados. Não conseguiu ajudar na criação por falta de dinâmica, também não apresentou penetração, não finalizou com qualquer qualidade e, na maior parte do tempo, esteve sumido do jogo, principalmente no 2° tempo.
Mancuello atuou recuando mais, isso o faz participar mais do jogo, porém ao pegar a bola no meio campo não encontrava um jogador se mexendo para sair da marcação e acabava recuando pro Cuéllar ou abrindo em Jorge, ao lado. Quando o placar apertou e faltava tempo, acabou subindo demais e novamente “sumiu” do jogo.
Arão começou recuando um pouco mais para ajudar na saída de bola, mas logo voltou a atuar no modo pelada e viveu de abandonar posição, geralmente abrindo na direita e subindo como um ponta, tentando alguns cruzamentos e errando a rodo (86% de cruzamentos errados).
Rodinei piora a cada partida, se é que é possível. Antes ao menos ia até a linha de fundo tentar cruzar, depois passou a insistir nos cruzamentos na linha de entrada da grande área, agora tenta cruzar da intermediária. Só ontem foram 77% de erros no fundamento que deveria dominar.
Para melhorar o ataque, Jayme esperou dar 15 minutos do 2° tempo, colocou Alan Patrick no lugar de Mancuello, Cirino no lugar de Éverton e Fernandinho no lugar de Sheik. Obviamente não melhorou muito, mas Alan Patrick ainda conseguiu de falta marcar um gol no final, após o placar já estar 2 a 0 pro Fortaleza.
Resumindo, o ataque só tem um tipo de jogada: Cruzamento pra área, fundamento em que errou 77% das vezes (sim, o mesmo número que Rodinei). E, se não bastasse o absurdo de investir em um só tipo de jogada e escolher justamente o pior fundamento do time, ainda por opção do treinador atuam sem um centroavante cabeceador fixo na área!
Defesa frágil
E se os peladeiros sobem alucinadamente ao ataque, por que esperar que voltem tão alucinadamente para recompor? Os passes errados na zona de ataque volta e meia pegavam o time do Flamengo muito adiantado e geravam contra-ataques perigosos. Por sorte geralmente tentavam pela meia esquerda onde Jorge e Éverton conseguiam evitar o pior, juntos fizeram 57% dos desarmes do time, com destaque para o lateral esquerdo que abdica do ataque e toma conta da defesa, sendo o jogador com mais desarmes não apenas no jogo, mas em toda a temporada.
A imagem acima, que circulou nas redes sociais como prova de que a defesa do Flamengo é um circo de horrores, é do momento do primeiro gol sofrido pelo Flamengo, aos 3 minutos de jogo. Observem o posicionamento dos jogadores, que só olham a bola, o modo como Rodinei é facilmente driblado, como os zagueiros falham na cobertura e Jorge fica sozinho contra 2 adversários. Para completar Paulo Victor está mal posicionado e, apesar de ter falhado em alguns lances do jogo, de jeito algum pode ser responsabilizado pelos erros de toda a defesa ou mesmo pela eliminação.
Todos os adversários conhecem os problemas do Flamengo e jogam no erro de posicionamento e execução do time. O Fortaleza fez como manda a cartilha e se fechou, tirando a dinâmica e velocidade do ataque rubro-negro, ainda se posicionou para se aproveitar das falhas de posicionamento dos meias e de Rodinei para marcar os gols que carimbaram a classificação.
De quem é a culpa?
O plantel é bom, mas isso não garante um bom time. Vejam o Real Madrid passando vexame com Cristiano Ronaldo e companhia sob o comando de Benítez, mas que sob o comando de Zidane chegou à final da Champions. Futebol do século XXI é coletivo e os jogadores precisam funcionar como engrenagens de um sistema muito bem regulado.
O erro começou, como sempre, na hora de contratar o treinador e planejar o plantel. Rodrigo Caetano apesar de ser o diretor tem os poderes limitados pelo conselho de futebol e pelo vice-presidente, ou seja, a responsabilidade é compartilhada por todo o comando do Flamengo.
Como puderam contratar um treinador especialista em retranca para um time que teria filosofia ofensiva como Godinho e Bandeira de Mello tanto alardearam na campanha eleitoral? Será que o Barcelona contrataria o Simeone? Ou seja, contrataram um ótimo sushiman para ser pizzaiolo e obviamente as coisas não encaixaram. Muricy não tem ideia do que seja um time ofensivo e muito menos sabe arrumar um.
Um exemplo parecido, mas de condução distinta é o São Paulo. Osório construiu e deixou como legado um São Paulo ofensivo, mas o clube trouxe para esta temporada um treinador defensivo, ou seja, filosofia oposta ao primeiro. Ao contrário da diretoria do Flamengo, a do São Paulo não obrigou Bauza a mudar seu estilo, aceitou a mudança para um futebol defensivo e, apesar de ter sofrido com a transição, hoje vê o time evoluir e se classificar para a Libertadores.
Muricy está com problemas de saúde, desgastado com a torcida, acumulou resultados ruins e vai perder o vestiário a qualquer momento, afinal jogador não gosta de carregar a culpa sozinho. Dado que Sampaoli está livre e é bem visto pela torcida, a hora de ir atrás com tudo é agora. Na inviabilidade, vai atrás de outro estrangeiro também de princípios sólidos e que saberá arrumar essa terra arrasada que Muricy deixa.
Saudações Rubro-Negras